Papo de carta
PAPO DE CARTA
Natal F Cardoso
Dentro da caixa a cartinha suspirava.
-Ai! Ai! Ai!
Um grande envelope ouvindo aquilo curioso perguntou.
_ Mas que tanto lamenta? Você daqui a pouco vai ser triado pelas mãos das pessoas. Elas te jogarão em um cantinho junto de outras cartas e depois você será enviada para o seu destino. O que há de tão doloroso nisso?
- Você fala isso porque não é você que vai ficar horas e horas rodando em uma máquina. Aí! Só de pensar já sinto enjôo - solta um suspiro - Era bom quando mãos macias me triava principalmente, as mãos femininas eram tão macias, isso sim era bom, não esse turbilhão.
- Mas não é nem um pouco divertido?
A cartinha faz uma cara de dúvida.
_ É algumas acham. Tem um AO remetente que gostaria de experimentar, disse que iria adorar, mas eu nunca mais não o vi, acho que virou refugo e foi para a caçamba.
Um cartão internacional ali ao lado disse:
_ Que nada, você está exagerando, não deve ser assim tão ruim, lá de onde eu venho Paris é claro, todos nós passamos em máquinas semelhantes e todos gostamos. E também não são horas, são só alguns minutos. Você acha que iríamos inventar algo tão lento? São máquinas moderníssimas e práticas, que aumenta a produção.
_È só podia mesmo ser coisa de francês, vocês é que gostam de dar piruetas por aí.
O cartão virou a cara, deu um suspiro e disse:
_ Cherry isso é coisa de cartas subdesenvolvidas. Vocês não sabem como é importante a automação, além da rapidez, evita-se erros infantis desses humanos cabeçudos.
Isso ouriçou as cartas nacionais. Todas olharam com desdém para aquele cartão francês e outros estrangeiros.
Alguns cartões ingleses mantiveram sua pose sóbria e fria, os alemães deram gargalhadas, os africanos que estavam distraídos não se manifestaram.
Um SEDEX 10 que estava por ali esperando ser levado ao seu destino gritou.
_Um momento. Eu nunca rodei nessas máquinas, pois meu volume é muito grande, mas o senhor não tem o direito de ofender-nos, afinal está chegando agora ao nosso país e foi recebido muito bem. Por isso comporte-se como um convidado e respeite. É evidente que tens anos de vantagens sobre nós, mas isso não lhe dá o direito de nos ofender. Fique o senhor sabendo que somos admirados em todo o mundo como uma empresa competente e capaz de cobrir com eficiência um país continental. Como sabe uma área muito superior a de seu país e de outros vizinhos seus.
O cartão olhou em volta e viu que todos olhavam para ele como que esperando uma resposta.
- Bom, na verdade eu fui um pouco rude e deselegante, mas ela me ofendeu dizendo que nós franceses somos chegados a umas piruetas.
SEDEX 10 olhou para a cartinha que meio encabulada disse:
_ É, pensado bem acho que exagerei um pouco. Eu sou um pouco chatinha.
Pensando bem, acho que é até divertido. Disse ela olhando e rindo para as outras cartas que consentiam entre si.
O SEDEX 10 disse:
_ Bom acho que está resolvido. Vamos procurar nos acertarmos, pois se nos recusarmos a desfrutarmos da modernidade estaremos arriscando a ficarmos para trás. Eu sei que no começo é difícil, mas todos nós temos meios de nos adaptarmos. Em lugares mais desenvolvidos, eles também tiveram dificuldades, mas se adaptaram e nós podemos fazer o mesmo.
E assim lá se foram as cartas e cartões para seus destinos.
FIM