A quarta tentativa
Era uma manhã parecida com todas as outras. Eu havia acordado às nove, fiz o café. Ele ligou a tevê para assistir o jornal. Como sempre acordou primeiro, já havia tomado banho e estava arrumado pra sair.
Levei até a porta depois do café, dei um abraço apertado, senti o cheiro do seu pescoço e dei um breve sorriso a ele.
-Você está melhor hoje! Que bom. -Ele disse me olhando nos olhos.
Eu te amo. -Foi a única coisa que consegui falar.
Sua boba. -Disse carinhosamente.
Fechei a porta, desliguei a tevê. Arrumei os livros da J.K Rowling que estavam no chão. Peguei um caderno e comecei a escrever para minha mãe. No fim da escrita o papel já estava ensopado das lágrimas que caiam de meu rosto, borrando as letras feita a tinta vermelha.
Coloquei a carta debaixo do cinzeiro dele, fui até a cozinha, peguei um copo cheio de água, duas cartelas de Sertralina e uma de diazepam. Tomei todas até a última gota de água. Me deitei na cama a espera do meu ceifador.
Com poucos minutos o meu corpo estava mole, já não sentia mais meus braços como antes, pareciam estar pesados demais. A visão já começará a embasar, e os lábios secos eram como eu havia imaginado. O som de fora de casa, já não era mais perturbador, a sensação de está indo em paz era satisfatória, mas não duradoura. Logo o estômago começou a doer, como se houvesse o ser transtornado tentando sair de dentro dele.
O corpo tremia na mesma intensidade que a dor aumentava. A visão ainda meio preservada deixava que eu observasse a luz do teto do quarto. A idéia de morte indolor já não existia, sabia que era um fim mais trágico do que o planejado. Nada na vida segue conforme o planejado talvez seja essa uma dádiva divina, se de fato existir alguma divindade.
A dor já não era tão forte, ou já tinha me acostumando com ela, quando senti um puxão me levando pra cima, depois dois dedos foram introduzidos na minha garganta. Eu vomitei de imediato. Ele sabia exatamente o que fazer, eu já havia tentado outras vezes.
Fiquei paralisada em transe entre dois mundos, o da morte que estava prestes a me abraçar e o dele que tentava me trazer de volta para aquilo que chamava de vida. Ouvia algumas palavras do que ele dizia, sua voz parecia desesperada, mas nunca consegui compreender exatamente o que elas significavam naquele momento.
Me carregou no colo, para fora de casa. Era possível ver pessoas, vultos como plateia assistindo a fracassada tentativa de desaparecimento de alguém. Parou um táxi e me levou direto para o hospital.
A quarta tentativa foi tão inútil quanto às outras três.
1° A quarta tentativa foi a mais próxima de conhecer o Tártaro.
2° Ele só voltou pra casa porque havia esquecido o crachá. O CRACHÁ.