O noivo no velório

Era março do ano de 1997. Semana das Dores de Nossa Senhora, pois já se encontrava a menos de uma semana para o início das festividades da Semana Santa.

Dona Maria, uma senhora de mais de oitenta e cinco anos de idade faleceu em sua residência. Estava acamada há poucos dias, mas seu quadro de saúde ficou complexo e seu falecimento veio rápido. Foi somente dizer algumas palavras de recordações e disse que viajaria para um novo sol, um lugar cheio de luzes, cheio de flores vermelhas, verdes, amarelas e um gramado muito verde, com árvores dividas de cinco a cinco metros. Foram estas as suas últimas palavras. Deu um suspiro e entregou sua alma.

Mariinha, carinhosamente chamada pela família, estava no quarto e pôs-se a chorar, porque além de perder a sua querida mãe, também estava perdendo uma grande amiga, uma pessoa cheia de estórias para contar, uma grande conselheira que, em suas palavras, trazia ouro de conhecimentos. Perdia um tesouro que Deus lhe deu. Um tesouro valioso, que as moedas existentes no planeta terra jamais poderiam comprar. Era um tesouro incalculável.

Muito triste, com as lágrimas escorrendo em seu lindo e afagável rosto, Mariinha pegou seu telefone celular e, em prantos, começou a telefonar para os familiares transmitindo a péssima notícia, naquela noite.

Joana, uma calorosa amiga de Mariinha, foi uma das primeiras as chegar à residência. Muito educada, muito meiga e muito hábil para tratar de casos semelhantes, também fazia parte de sua rotina de trabalho, porque ela era psicóloga, estava firme e prestando seu amparo à amiga. Suas palavras ressoaram de benevolências e de uma gratidão que convenciam muitos que ali estavam. Um amparo, um conforto são palavras nativas para um momento triste, mas importante para a família. Dona Maria era uma ótima pessoa. Sua idade não era obstáculo para nada. Era alegre, sentia-se jovem até mesmo em suas roupas. Sempre estava no auge da moda. Era uma grande consumidora da loja de roupas e acessórios da esquina. Vestia-se, como se diziam as pessoas, na última moda do momento.

Comovidos todos ali presentes, com a chegada do médico da família, acompanhado do pessoal da funerária, Mariinha foi retirada do local por sua amiga e conduzida a outro lugar, para que Dona Maria fosse retirada, encaminhada para a funerária, onde o velório seria em outro local, um lugar chamado velório municipal, construído para facilitar o acesso dos visitantes e também próximo ao cemitério.

Decorridos tais procedimentos, Joana e Mariinha, acompanhadas dos familiares, foram para o local e aguardavam a chegada do corpo. O velório seguiria noite a fora e o enterro seria por volta das treze horas do dia seguinte.

Muitas foram as pessoas que ali passaram. Mensagens de condolências, de estímulos de vida, de agradecimento e outras mais foram ditas.

Por volta das vinte e quatro horas, as pessoas foram indo embora e restaram-se umas quatro ou cinco pessoas para velarem Dona Maria por todo resto de noite. Joana estava firme com a amiga.

Em um determinado momento, já Mariinha estando um pouco conformada, apesar de as outras pessoas terem retirado para um sala ao lado para um pequeno cochilo, Joana contou um segredo para a amiga.

- Amiga, eu passei por isto. Foi comovente. Há dez anos, eu tive um namorado. Era ele alto, pesando uns oitenta quilos, cabelos anelados, olhos azuis, sobrancelhas grandes, usava um óculos escuro, uma espécie de chapéu que mais parecia um capacete de moto. Ele não tirava este chapéu para nada. Era muito culto. Na área da Física e da Matemática, não tinha ninguém. Tinha somente um problema: Ele somente encontrava comigo toda noite. Durante o dia, jamais o encontrara.

- Perguntei para ele onde morava. Ele dizia que era funcionário de uma empresa aérea e suas folgas eram coincidentes à noite, ou seja, uma vez por semana ele aparecia à noite.

- Amiga, olhes que estavas namorando um fantasma. Em voz triste, respondia Maria.

- Não, amiga. Ele era ser humano mesmo. Teve um dia que ele queria (interrompendo a voz fracamente, em voz baixa, cochichando no ouvido da amiga, disse algumas palavras, as quais não poderei revelar), uma pequena gargalhada de Maria, já imaginou o que seria.

- Eu não quis não. Fiz de tudo para segurar e consegui segurar. Voz forte de Joana, ouvia-se com muita exatidão.

- Ele me falou que eu era besta, antiga, que não estava preparada para a vida moderna, a vida além das estrelas, e foi embora.

- Até hoje, neste dia, nesta hora, nunca mais o vi. Se o vesse, dos anos que passei, aceitaria o convite dele...

Risos, um pouco de risos, não muito altos, mas aquelas risadinhas de piadas.

A noite estava ficando um pouco fria, pois a estação de outono já havia iniciado. Uma brisa soprava lá fora e às vezes uma das velas apagava. Maria e Joana, com um isqueiro na mão sempre as acendiam, porque não queriam que o corpo de Mariinha ficasse às escuras.

Quando a madrugada já começa dar sinais de desaparecimento, Joana disse:

- Estou sentindo uma zoeira na cabeça como se fosse um rádio fora das ondas. Olhe, meu celular não está funcionando.

Maria, vindo do aposento do velório, disse a mesma coisa:

- Não é somente o teu, mas o meu também. Sinto um barulho esquisito, um forte chiado de ondas de rádio. Não tem nenhum rádio ligado aqui.

Alguns, dos que estavam no aposento do velório, disseram a mesma.

De repente, um enorme clarão reflete no salão. As roupas das pessoas que ali estavam brilhavam feito a luz solar. As velas ficaram tão brancas que se misturavam com a luz. O rosto da finada Maria brilhou tão forte que se viam os algodões em seu nariz. No meio deste brilho, apareceu um homem de vestes brancas, da mesma forma que Joana confidenciou à amiga. Em vagarosos passos, a entidade aproximou de Joana, tocando seu rosto, tocando sua barriga e deu-lhe um beijo muito forte e muito demorado. As pessoas, que ali estavam, viam o que estava acontecendo, mas não tinham forças para tomar quaisquer reações, pois estavam imóveis, não conseguiam mover sequer um dedo.

A cena aconteceu e durou mais ou menos uma meia hora. De repente, o clarão foi desaparecendo e tudo voltou ao normal, exceto Joana, que ficou desacordada por um bom tempo. Foi medicada, ficando internada com uma pequena cicatriz na barriga, fazendo com que não fosse ao sepultamento da mãe de sua amiga.

Nove meses após este fato, do ventre de Joana veio um menino, com as mesmas características do homem que se disse namorado dela. O menino cresceu e misteriosamente desapareceu quando tinha vinte anos, viajando para uma cidade, foi arrancado de seu veículo por um clarão semelhante ao do dia do velório de Maria.

JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO
Enviado por JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO em 25/03/2018
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