HORÁRIO COMERCIAL.
“Ele é um pintor de mão cheia!”
Foi o que disse dona Doralícia quando indicou Gláubio pra pintar nossa casa.
“Ih... precisa ver. É muito caprichoso, não deixa um mínimo detalhe passar. Forra todo o chão, e quando termina não fica uma só gota de tinta caída. É dez! Ah... é de confiança.”.
Não temos muito tempo pra essas coisas, e procuramos uma indicação de alguém confiável.
“Só tem dois detalhes:, - disse ainda dona Doralícia - gasta muita tinta! Em compensação o preço da mão de obra não é caro, então fica ‘elas por elas’; o outro detalhe é que não gosta de chegar cedo, e vai embora cedo também. Ele diz que só trabalha em horário comercial.”
Isso pra gente não era problema, pois todos trabalhamos fora em ‘horário comercial’.
Em todo caso fomos procurar mais referências de Gláubio pra não ficarmos com dúvidas, afinal teríamos que deixar esse pintor sozinho em casa.
“É muito barateiro”, - disse seu Paulo, um morador do bairro - “mas gasta uma tinta empurrada! Sai ‘elas por elas’, mas compensa no serviço, é bem caprichoso. Mas não adianta apressar ele não, pois ele fala que ‘só trabalha em horário comercial!’ Não deve estar precisando muito de dinheiro. O bom é que ‘é de confiança’ ,” disse seu Paulo.
Era sempre assim; todos que perguntávamos sobre Gláubio diziam quase sempre a mesma coisa: “Gasta muita tinta e só trabalha em horário comercial.” Mas também diziam que era “barateiro na mão de obra e era de confiança!” Uma coisa positiva, pois como trabalhamos fora, temos que deixar a casa nas mãos dessa pessoa.
E assim foi.
Procuramos uma terceira pessoa para buscar referências, e até mesmo ver o trabalho de Gláubio.
Marcamos um encontro num ponto comercial que Gláubio estava pintando, e chegamos lá as 07h50min. conforme combinado com um conhecido nosso pra olharmos o serviço. “Ele não chega antes das oito”, - disse nosso conhecido – pois diz que “só trabalha em horário comercial.”
Oito e cinco! Estaciona um ‘carrão’ em frente à obra. Era Gláubio.
Nosso conhecido parecendo intimo de Gláubio disse: “Tá podendo, hem pintor?”
“É... vocês veem as pingas que eu bebo, mas não veem os tombos que eu levo.”
Vimos o trabalho do Gláubio e acertamos com ele pra pintar nossa casa assim que terminasse esse serviço que estava fazendo.
Numa segunda feira Gláubio estava em sua casa ainda na cama com sua esposa quando toca a campainha.
“Que horas são?” - pergunta Gláubio à esposa. “Oito e um.”
“Ainda bem, pois só atendo ‘em horário comercial’!”
E levanta-se pra atender a porta.
Era a polícia com um mandado de prisão, e de busca e apreensão!
Levaram o Gláubio algemado, e dois camburões cheios de latas de tinta!