AS CHICOTADAS DA FLORESTA.

Era uma linda tarde. O sol se punha no horizonte. Os pássaros cantavam irradiantes as suas cantigas de final de tarde. Talvez suas cantigas eram para a despedida de um lindo dia ou talvez era uma canção para atrair sua amada ao colo sereno da noite que se aproxima.

Embaixo das árvores estava o pobre do Joaquim, com sua enxada sobre as costas, uma cabaça de água, já vazia, um bornal no ombro esquerdo contendo seu caldeirão, ainda com algum resto de arroz e feijão. Ao lado da marmita, estavam algumas abobrinhas, bem novinhas, que Joaquim levaria para comê-las fritas, misturadas com fubá e uma pequena porção de pimentas, as famosas pimentas malaguetas.

Com o sol já se pondo no horizonte, Joaquim caminhava a passos lentos para chegar à sua casa, porque o dia foi muito trabalhoso. Ele capinou uma grande lavoura de milho, que continha também a plantação de feijão, aquele feijão preto, feijão apreciado pelos cariocas do Rio de Janeiro. A plantação era grande e Joaquim colheria uma boa safra e venderia para o comerciante carioca que passava naquelas bandas de ano após ano.

Os pássaros faziam seus cantos como se fossem uma linda serenata para Joaquim, para a mãe natureza e quem sabe para alguns que ali passavam. A jacutinga, juntamente com seus filhotes, fazia um enorme barulho, pois era verão e algumas poucas nuvens negras davam sinais de que a noite poderia ser chuvosa. Até um sapo ou algumas formas de anuros começavam a montar seus concertos de verão. Um estava mais afinado, ao passo que outros desafinavam, mas aos poucos iam acompanhando o compasso.

Em sua mente, Joaquim estava feliz, pois o resultado de seu trabalho foi ótimo. Capinou a roça, afagou os pés de feijão e ainda encontrou algumas abobrinhas e elas seriam saboreadas por ele e sua família. Ele era um lavrador muito humilde, mas uma grande pessoa, com uma honestidade fora do comum. Não tinha muitos recursos, mas se orgulhava muito e de peito aberto se vangloriava em dizer que sua única filha estava estudando para ser médica. A família aproveitou os incentivos do governo federal e ela estava cursando Medicina na faculdade Federal. Para ele, era uma grande vitória: A filha de um lavrador ser médica, ser um doutora e atuaria na pediatria.

Feliz da bela tarde e ouvindo o canto dos pássaros, Joaquim encostou em uma árvore e ficou a observar a natureza. A mesma natureza que ele contemplara há algum tempo, seu tempo de criança, naquela mesma terra que fora herdada de seus pais e ali, ele, com mais ou menos cinquenta anos, relembrava de sua vida, de sua conquista, de seus amores, de seu namoro e casamento com sua atual esposa e de sua maior riqueza: Sua linda filha. Em um pequeno momento, também pensou sobre um causo que seu pai contou-lhe, há muito tempo, de um empregado que fora chicoteado, naquele mesmo lugar, e não sabia de onde vinham as chicotadas. Era um pesadelo, mas por um pequeno momento, Joaquim duvidou do acontecimento e pensou consigo mesmo:

- Isto não existe. É pura e simplesmente invenção de meu finado pai. Ele gostava muito de contar suas mentirinhas e estas eram parecidas com aqueles contos de cinema, aqueles filmes do Conde Drácula, do Mazzaropi e outros mais. É pura mentira.

Neste momento, Joaquim teve suas necessidades biológicas de ir ao banheiro. A vontade era muita que não dava tempo o suficiente para chegar até sua casa. Ali mesmo, escolhendo uma moitinha de capim, debaixo de uma árvore e colocando seus pertences ao pé de outra árvore, Joaquim desceu as calças e descarregou o intestino.

Alguns segundos se passaram e Joaquim sempre pensando e rindo do causo de seu pai sobre as chicotadas e ria em voz alta e exclamava:

- Que besteira, neste mato fechado, onde sairá alguém para dar chicotadas no outro. É muita besteira, é muita mentira...

Mal acabou de pensar, sentiu suas costas arderem. Um barulho de chicote ressoava em seu corpo que até se ouvia o eco das chicotadas. Ele pensava em gritar, mas as dores das chicotadas eram tão fortes que somente gemia. Pensou em correr, mas suas calças entrelaçavam-se a seus pés fazendo com que caísse. Então, caindo e sofrendo de dor, ele não pensou em mais nada: Mesmo caindo e se misturando às suas fezes, ele se foi próximo à velocidade de luz. Chegando em casa, contou para sua esposa e somente foi buscar seus pertences no outro dia.

JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO
Enviado por JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO em 14/01/2018
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