Parir no sertão
Eu nasci, nas quebradas da Ribeira. No sopé da ladeira que descamba para o baixão. Na sombra da gameleira no dia de São João. Minha mãe! Uma mulher parideira, mas uma guerreira, quando eu cheguei ao mundo já encontreis 18 irmãos. Cada um de um pai diferente. Minha mãe dizia que homem só prestava na hora da precisão. Ela tinha chegado da feira carregando um surrão. Quando sentiu as dores , chamou sua irmã Dolores e foi dando as orientações. Pega uma esteira, estende ali no terreiro, que esse parto vai ser ligeiro, já sinto o menino nascer. Esquenta na trempe uma água, coloca nela alfazema antes da água ferver. Que é pra eu banhar o menino pra ele ficar cheiroso na hora que o povo vier ver. Pega uma garrafa de pinga para servir as primas que gostam de beber. Mata uma galinha do chiqueiro, prepara um pirão com tempero, não esqueça a pimenta de cheiro, que eu já quero comer. Solta depressa um rojão. Daqueles de tremer o chão, que é para o povo saber. Que nasceu mais um cristão que eu botei no mundo e vou ensinar a viver. Viver como cabra macho. Andar com uma faca no quarto e de nada temer. Ser devoto do santo, que ele nasceu no seu dia. Pedir que ele lhe ajude a ser forte, não ter medo da morte e ser um bom pai de família. Que aprenda a amar o seu torrão. E nem que lhe ofereçam um milhão, nunca deixe o sertão. Essa é a minha alegria.