Na Dúvida, Escute o Coração.

         Certo dia eu levava um casal de amigos para passear de Fortaleza pela praia até Canoa Quebrada. No caminho, após já termos percorrido mais de 80 kms de praias, dunas e avistado vários locais que são verdadeiros cartões postais, parei a Land Rover em uma barraca a beira mar. O casal era só felicidade. Quando sentamos a mesa da barraca um senhor se aproximou para nos servir, pedimos o que no Ceará se chama “trio” (um prato com peixe, camarão e lagosta). Como estava dirigindo, resolvi tomar apenas um suco e o casal uma cerveja.O homem que servia de garçom na barraca, era também pescador. Sentou-se num banco que ficava próximo a nossa mesa.Rodrigues, meu amigo, perguntou ao pescador:

- Como é a vida aqui? A resposta veio junto a uma outra pergunta:

- Como é a vida de onde o Dr vem?

Rodrigues disse ao pescador:

- Não é essa moleza, lá se corre o dia todo, ando de terno e não tenho tempo pra nada.

O garçom então contou-nos a seguinte história:

- Sabe doutores, eu também quando era jovem já morei num lugar esquisito. Todo mundo lá, andava muito depressa. Eles faziam uma casa em cima da outra, e chamavam aquilo de edifício. Eu nunca achei fácil mesmo fazer casa em cima de casa, por isso não estranhei o nome que deram praquilo lá. Aqui, como os doutores podem ver, nossas casas têm só a altura pra gente ficar dentro e como aqui não precisa daquela coisa toda pra viver, nossa calçada é a praia, nossa avenida é o mar, nosso carro é a jangada, o motor da jangada é a vela, e o combustível é o vento. Viste então doutor, porque voltei logo pra cá? Percebi que ali não era pro meu bico. Agora doutor, se mal lhe pergunto, se o Sr. vê isto também, porque não muda logo para cá?

Diante da pergunta do pescador, Rodrigues sorriu e disse:

- Vou pensar no assunto.

E o pescador, que era simples, mas bom observador, disse de pronto a Rodrigues:

- Não pense não doutor, coisa muito pensada não presta. O pensamento às vezes trai a vontade do coração.

A conversa parou ali, pois a comida estava pronta e o pescador foi apanhá-la. Serviu-nos e foi até sua jangada que estava na praia a poucos metros da barraca. A comida estava, como sempre, fantástica. O casal se deliciou, e se eu não tivesse alertado que ainda havia muito que conhecer, acho que teriam ficado mais tempo pra ouvir o pescador. Ao nos despedirmos para seguir nosso passeio, Rodrigues brincou com o pescador:

- Vou pensar em mudar pra cá.

E novamente ouviu o conselho do pescador:

- Pense não amigo, faça sempre o que o seu coração mandar.
(J. Ruy)