Crise? O quê que é isso, sô?
Crise? O quê que é isso, sô?
_ É uma maçada, sô! Se não fosse pelos pescador da cidade, que vorta e meia aparece por aqui, nóis nem ficava sabendo de determinadas coisa. Crise? Por cá num tem dessas coisa, não sinhô. A terra boa produz de tudo, tendo coragem para encarar uma enxada, as roça fica viçosa no tempo certo, o arroz, o feijão, a mandioca, o milho, verdura, legume e fruta a gente colhe mais do que a comunidade carece. O mais... Ó? As lata lá em casa tão cheia de carne curtida e prensada na gordura de porco. Boi? Quando se mata um novilho é preciso dividir com os vizinho, salgar e curtir em sol e sereno parte da carne a modo de num deixar estragar. A galinhada no terreiro produz frango pro consumo e ovos da mió qualidade, com tanta fartura que de vez em quando um companheiro precisa levar carregamento pra feira da cidade. Aí pra aproveitar a viage, leva tamem queijo, rapadura, cachaça, polvilho, pimenta malagueta e cumarim, farinha de mandioca, pequi, araticum cagão, jaca... Essa coiserada toda da roça que a gente da cidade fica doida quando vê. O rio traz abundância de peixe que inté sobra pros camarada da cidade, feito o sinhô ansim, que vem apanhá um pouco. Ré, ré, ré... Diz que Nhô Joaquim Sucupira, véio tão véio que nem ele sabe quantos ano tem, reza nas água do rio quando escuta baruio de motor de carro se aproximando. Aí os peixe se amoita tudo, pra mó de ninguém pegá nada. Ré, ré, ré... O sinhô me descurpa tá rindo ansim. Num é por mardade não. É que eu vejo ocêis pescano por distração. Ré, ré, ré... Aqui nóis pesca só por necessidade de comê peixe, que diz que é danado de bão pra saúde do cristão. Nóis bota a panela com gordura no fogão de lenha e corre no rio pra buscar o peixe só na quantia que se precisa. Pra distrair nóis faz é outras coisa. Óia, nóis chama o Quinzim da Safona, o Juca da Viola e o Rogerim Zabumbeiro, que é neto de um baiano do Pernambuco que apareceu por aqui cum a famía há uns quarenta anos mais ou meno, gostô do marasmo do nosso lugar e foi ficano. Ele, o véio Baiano, num é muito chegado a serviço não. Tamém já tá carregado de anos na cacunda lá dele, coitado! Mas o neto Rogerim é bão pra bater uma caixa. Aí o trem ferve a noite inteira. Alguém traz um leitão assado à pururuca, outro traz uma costela inteira de boi pra se assar na brasa, um terceiro chega com um pipote de cachaça véia de sua fabricação. Ré, ré, ré... É bão demais da conta, sô! Primeiro o Zezinho do Bastião da Baixada do Brejo, que quando moço tinha inventado de ser padre e ficô cumo seminarista lá em Mariana uns seis meis, agora casado e pai de oito bacurizinhos, e sem perder a mania de beato, tira uma reza do terço, porque nóis tem que se alembrá de quem fornece os trem tudo que nóis tem precisança. Depois nóis acende uns fogo pra alumiá o terreiro e aí é só cantoria de moda boa e muita dança. A gente vai chupando uma pinguinha devagarzinho e comendo carne assada. Os mais véio costuma sentar num canto mais arretirado, ficam fumando o seu paieiro e arrecordando a mocidade lá deles... Mas, crise? Sinceramente, moço! Isso nóis num conhece não sinhô. Congresso? Engraçado, sô! Num sei o que quer dizer isso não. Mas nasceu um bezerrão bonito lá no meu sítio hoje e eu tava exatamente espremendo os miolos, caçando um nome bunito pra butá no bicho. Boa sugestão, viu? Óia: Congresso! Vou me alembrá do sinhô cada vez que eu chamar o meu boi por nome. Congreeeesso! Êia, boi! Ré, ré, ré... Crise... Crise... Crise... Ingraçado, Sô! Tinha um cumpade meu, o Cumpade Genaro, que tinha uma chacrinha lá na Vorta do Fundão. Pois é! O Compadre Genaro tinha um moleque chamado Crise. Bão! O nome dele de verdade era Acriso, eu lembro bem o nome do pobre do bacuri por mó de que foi eu mais a muié lá de casa que batizemo o bichim la na igreja de Santa Divirge, a modo porque eu mais Cumpade Genaro nos tornemo cumpade. Mas ele, o Crise, coitadinho, viveu pouco. Deu uma caganeira lá nele que infiliz num guentô. Um dotô lá da cidade disse que o que levou ele a óbito foi uma tal de inanição. Disse que os peito da cumade num tinha provisão suficiente. Engraçado, sô! Terra boa de má curtura. Veja o sinhô. Mas num me sai da cabeça que o minino morreu foi mesmo de caganeira. Governo? Ah, bão! Isso nóis sabe o quê que é, uai! Quem é que num sabe? Tem um tal de INCRA, que é ligado a esse sujeito aí, que todo ano nóis tem que levar uns cobre lá pra ele. Ô, gente! Então o sinhô tá pensando que nóis num sabe de nada? O quê que é isso, sô? Nóis é da roça mais acompanha as nutiça. Eu, heim!?