O MASCATE
    
Em um passado distante, quando as fazendas eram cheias de famílias de colonos, que formavam café de porcentagem, plantavam mantimentos para seu consumo, como arroz, feijão, milho. Tinham também animais de trabalho, criação de porcos e as vezes até umas vaquinhas de leite.
     
Nesse tempo o pessoal das fazendas quase não iam a cidade, somente em festas da igreja como natal, semana santa ou festa do padroeiro, no mais ia apenas o chefe da família para comprar aquilo que não produzia, como sal, açúcar, querosene, a cachaça estava presente em quase todas as compras e uma vez ao ano quando vendia o café levava a esposa e os filhos para comprar alguma roupa pronta ou pano para costurar camisas e calças, botina para os homens e um par de sapato para as mulheres.
     
Esses sapatos eram economizados ao máximo, pois só usavam em ocasiões especiais, se fossem a cidade levavam o sapato na mão até a entrada da cidade onde limpavam os pés e os calçava, pois devido a falta de costume causava um incomodo danado e eram retirados assim que saia da cidade para casa que retornavam descalço.
   
Era muito comum nessa época os mascates que andavam pelas fazendas a pé ou a cavalo, vendendo roupas, pentes, arquinhos, presilhas para o cabelo, perfumes e qualquer novidade que surgisse no mercado.
    
Esses mascates devido a frequência que visitavam as fazendas acabavam fazendo amizade com os moradores, tinham aqueles que ficavam até íntimos da casa, que faziam refeições e ocasionalmente até pousavam em casas de famílias.
     
Neste cenário que entra o nosso personagem, muito simpático, educado, respeitador e bom de prosa que só ele. Mas um pouco desajeitado e as vezes a sorte não conspirava a seu favor, colocando-o em situações pouco confortáveis.
     
Um mascate que viajava em uma égua baia muito bonita, visitava todo mês uma grande fazenda de café da região, com as qualidades já mencionadas acima, fez amizade com o pessoal das colônias e sempre chegava com algum produto novo o que era esperado com ansiedade principalmente pelas moças, ávidas por novidades e saber como andavam a “moda” pelas cidades.
     
O mascate chegava geralmente no domingo de manhã e as vezes no sábado à tarde visitava alguns fregueses, depois jantava e dormia em uma das casas para continuar o trabalho no domingo que só ia embora depois que visitasse todas as casas e ter por vezes quase esgotado seu estoque de mercadorias.
    
Uma vez ele chegando na fazenda foi primeiro na casa de uma família de italianos e conversa vai conversa vem o tempo foi passando, a mulher viu que o marido ia convidá-lo para jantar e pernoitar em sua casa, deu um jeitinho quando teve uma oportunidade e soprou para o marido não convidá-lo que a comida era pouca e estavam desprevenidos no momento para aumentar a janta.
     
Disse isso e voltou para os afazeres da cozinha, o marido não deu muita atenção e contrariando o que a mulher disse, fez o convite, o qual foi aceito na hora pois já era esperado. Nisso o dono da casa deixou a visita na sala e foi a uma cocheira que tinha no fundo do quintal soltar sua égua e dar a ela agua e uma porção de milho.
     
A mulher aproveitando a oportunidade vai até a sala para chamar a tenção do marido, como já estava escurecendo e as lamparinas ainda não estavam acessas, ela vê na semiescuridão apenas um vulto do homem sentado na sala, aí chega devagar puxa sua orelha com força e diz:
-- Não falei para não convidar o homem para jantar que a comida era pouca.
No que responde o mascate sem graça diz:
-- A senhora não se avexe eu nem tô com fome.
     
Noutra ocasião o moço hospedado numa casa, a noite com a família reunida na sala com o claro das lamparinas, vendo um álbum de fotografias antigas, surge a fotografia de um senhor bem idoso, o moço diz:
-- Nossa que velho feio. A dona da casa fala é meu pai, ele responde envergonhado: -- é feio mas um feio simpático.
   
E aconteceu mais uma situação embaraçosa para o nosso mascate. Ele passou pela fazenda vendeu uma calça para um menino, quando a mãe lavou a calça encolheu foi parar no meio da canela. Quando ele voltou no outro mês, chegando aquela casa de cara já viu a condição da calça, pensou rápido e disse:
-- Benza Deus como esse menino cresceu!
     
São coisas que essa geração não conheceu e nem faz ideia de como era a vida nas fazendas, as festas, os costumes e tradições e as visitas dos vendedores ambulante ou caixeiro viajante, que eram chamados apenas de mascates o elo entre a população rural e a “moda” da cidade.
João Batista Stabile
Enviado por João Batista Stabile em 04/04/2017
Reeditado em 26/11/2020
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