Boca de sabão

Juliana entrou chorando e se agasalhou no colo da velha Dinda

- O que foi desta vez minha menina ? aposto que foi o danado do teu irmão... ô menino que faz arruaça meu Deus , e tem uma boca suja ... toda vez que ralho ele despeja um monte de babozeiras em riba deu ... um dia esse menino inda leva uma boa da vida , deixe estar !

Era sempre assim Rafael era o endiabrado da Família e tudo fazia para atazanar a vida de todos mas, se fazia de santo na frente dos pais

Quantas vezes sua irmã menor levou castigo pelos aprontamentos dele?

As coisas sumiam da despensa e dona Dalva sua mãe, descia a ladainha na velha cuidadora da casa.

"Dinda você deixou entrar gente aqui, só pode! quem de nós ia dar sumiço nas comidas ? ou então você está dando de presente por aí. Fazer doação com as coisas do outros é fácil né?

-Deixa sr Jerônimo saber disso , eu só não falo nada por não querer ficar sem você . Sei que Juliana gosta muito de você e isso ia partir o coração da minha filha ."

Mal ela virava as costas o menino surgia sabe-se lá de onde rindo e revirando os olhos imitando sua Mãe .

- Ah muleque danado.... foi tu, num foi?

Tu não me engana não trem arteiro, não é atoa que nasceu numa sexta feira 13, discunjuro!!

- Sua velha bruxa , desdentada não gostou? vou fazer mais !!

saia gritando o menino

Seu alvo era sempre a velha Dinda e a irmã Juliana

Certa noite Dinda foi visitar seu irmão e contou os causos, inclusive sobre o menino , ela já estava velha e aturar aquele pentelho estava ficando cada dia mais difícil .

- Imagina que eu ia viver pra ver isso meu irmão? no nosso tempo as crianças respeitava os mais velhos ....

Sr José deu uma longa baforada no cachimbo, depois remexendo o fumo disse:

-Dinda... pruquê ocê num dá um corretivo nesse minino?

-Mas o que eu posso fazer meu irmão? hoje ta diferente dos tempo de antigamente , se eu botar um dedo no cucuruto desse menino eu tou no olho da rua, eu gosto de lá e a menina precisa muito de mim .

Mas minha irmã tem muitos corretivos que cê pode dar hahahaha ...

- Mas mudando de prosa, cê gosta de geléia de goiaba Dinda ?

disse sr José olhando pro canto da cozinha onde tinha uma cesta cheia de belas goiabas vermelhas .

Fui na roça hoje e os pés de goiaba tava apinhado , se eu deixasse lá ia perder tudo, ia bichar ou os passarinho ia comer ....

Peguei tombém umas pimentas bonita, tem umas ai que disse que vem lá do outro lado do Mundo , é ardida pra danar...

Dinda se despediu do irmão agradecendo , fez uma rodilha botou a cesta de goiabas e pimentas na cabeça e foi embora.

A lua brilhava tanto que parecia dia, mas ela não reparou , tanto que estava preocupada

-Não aguento mais esse troço desse menino incapetado ...

Nem bem pensou tropeçou e o balaio virou , as goiabas e pimentas se espalharam pelo chão .

-Mas qui coisa ! vê se pode uma coisa dessa? agora a gente num pode nem pensar? Valha-me Nossa Sinhora !!

Recolheu tudo , misturando pimenta, goiaba e areia.

Dos males o menor , chegou na soleira da porta onde tinha um quartinho deixou a cesta lá , amanhã dava um jeito .

Às 05:00 da manhã a velha Dinda já estava separando tudo , num tacho as goiabas vermelhas já lavadas e descascadas

e no outro as pimentas também vermelhas lavadas .

- Sr Jerônimo entrou na cozinha procurando café

- Bom dia ! tá fazendo o quê Dinda?

- Geleia de goiaba seu Jerônimo, fui na roça de Jose e ele deu um bocado , tem pimenta também

-Ah aí eu gostei , prepara estas pimentas com muito gosto e pode botar uma cachaça dentro pra ficar bem curtida .

Hoje você prepara o café mais cedo, vou pra Cidade levar Dalva e os meninos , não se preocupe com almoço nem jantar, a gente vai voltar muito tarde .Assim você vai ter tempo de sobra pra fazer isso .

Ah ... até vou pedir pra você dormir aqui no casarão, pode chamar seu irmão se ficar com medo rsrsrs.

- Oxe... medo eu ? tenho medo de nada não senhor seu Jerônimo , mas ficar sozinha é de muita solidão nessa casa grande ,agradecida. Se o senhor fizer o favor de avisar pra ele era melhor , só pra ele num ficar sem jeito , sabe como é.... senão ele num vem , vai achar que ta abusando da sua viagem.

Tá certo Dinda na ida eu passo lá e aviso .

Fazer um pirãozinho e assar um pedaço de carne parecia de bom tamanho , José ia gostar de comer a velha comida

do tempo da sua Mãe...era isso que eles comiam quando pequenos, nem sempre tinha a carne, mas ai mudava pra milho

cozido, mandioca , batata assada...

Voltou pro tacho de goiaba e começou a fazer o doce

Nisso chega o velho com seu cachimbo no bolso

- Seu Jeroime disse que era pra eu cuidar docê ha ha ha

- Olha só quem vai cuidar mim.... ta mais fácil eu dar umas vassoradas por aí pra te defender hahahaha

- Já ta fazendo o doce? e a pimenta vai fazer o quê?

- Deixei separada pra num pegar o ardido no doce depois eu faço , seu Jerônimo gostou, ele quer no capricho, bem amassada e curtida na cachaça.

-Então é mió ocê fazer as duas coisas juntas, quer dizer, cada uma no seu tacho . Mas que hora boa de fazer isso hoje , quem sabe amanhã já tem um resutado kkkkkkkkk

-Tem razão ... mas num tenho quatro mãos

- Tem sim , olha aqui mais duas e sou bom fazedor de pimenta !

José ajudou Dinda o dia todo, ela fez um tacho de geleia de goiaba maravilhoso e ele caprichou no belo molho de pimenta.

- Isso ta de um jeito que é preciso comer pouco viu? avisa pro seu Jerome.

Depois de frio colocaram o molho e a geleia em potes fervidos pra não estragar , esperaram esfriar , tamparam e

guardaram na despensa

- Eu vou botar uma fita vermelha pra marcar qual é a geleia de goiaba.

Foi procurar a fita e José ficou na despensa matutando ...

Dinda voltou e disse:

E agora ? os potes são tão parecidos que eu não sei qual é a goiaba qual é a pimenta ...

-Goiaba é esse aqui e a pimenta ta lá atrás

disse José.

Ficaram prozeando até tarde da noite , lembrando as histórias e José se sentia feliz com aquele aconchego com a irmã.

Foram dormir e nem perceberam quando os patrões chegaram .

Um berro ecoou no meio da madrugada

Dinda deu um pulo da cama e correu para cozinha , logo em seguida José fez o mesmo com um candieiro na mão foi direto pra despensa.

Pegou o menino nos braços e levou pra cozinha onde já estavam o Pai ,a Mãe, e a velha Dinda com as mãos na cabeça .

- A culpa é minha meu Deus... deixei a pimenta em lugar baixo e ele pensou que era doce

- Mas minha irmã depois tu chora, agora pega água e sabão de coco pra lavar a boca dele isso arde como o diacho! um copo de leite ou coalhada tombém .

Com uma bacia de água ela passava levemente um pouco de sabão de coco , no pano limpava a boca e língua do menino que gritava de dor

-Tenha carma , tudo se resolve você vai ficar bom.

Enxaguou com bastante água e fez ele beber o leite .Depois de aliviar a dor passou a colocar compressas de chá de camomila frio na boca e na língua do menino, não sabia se isso era bom mas ia ajudar, e pelo tanto de chá que tomou logo estaria dormindo. Assim foi a noite toda .

Naquele dia todos acordaram mais tarde , até o menino sossegou e dormiu mas, acordou com os lábios enormes !

Seus olhos pareciam pedir desculpas a velha Dinda toda vez que ela dava colheradas de chá para aliviar o queimor ....

Enquanto isso A velha murmurava :

-Não entendo como foi isso, eu coloquei a fita no pote certo, se eu soubesse escrever eu deixava escrito ...

falava e olhava pra mãe do menino

-Pois é minha irmã a fita ta no pote certo, dona Dalva pode ir lá e ver que ta tudo certinho. O menino só não sabia que o outro era pimenta .

respondeu José com a cabeça baixa e já procurando seu cachimbo saiu pro quintal rindo baixinho.