A Pedra do doutor Oziel

“...Pra bom pescador não tem hora boa ou ruim pra puxar um peixe, tendo isca é o que vale!”

- Ouvi o Doutor Oziel dizer para o Eliedes Henrique, quando saiu já bem de tarde do bar na Avenida Getúlio Vargas, bem em frente ao Fórum, para ir pescar no lugar costumeiro no Rio Doce.

É que o Eliedes não concordava com pescaria à tarde, mas sim pelas madrugadas...

Nosso pescador entrou no seu carro, um jeep azulão, sem capota e com o para-brisa deitado sobre o capú... e seguiu em direção da Barbosa & Marques S/A, onde próximo do Rio, na cabeça da ponte estacionou o seu carro, pegou a linhada e a vara e em pouco tempo estava em uma pedra alta que ficava ali próxima do lugar chamada canalão, quase de frente para a ponte.

Nessa pedra, aonde ele pescava com bastante frequência, ninguém se atrevia a fazer uso do espaço para puxar, mesmo que fosse um lambarizinho! Pois segundo os pescadores não tinha espaço para dois barranqueiros e ali a preferencia era dos mais velhos, razão pelas quais a pedra passou a ser conhecida como “A Pedra do Doutor Oziel”.

Certo é que, quem pode apontar com exatidão este local é o Jurandir (mosquito) que era escoteiro na época e não saia daquela área.... Mas, vamos então ao fato mais importante daquele dia...

Terça-feira, 18 horas do dia 31 de março de 1964, enquanto o sino toca na Matriz de São José e o mundo se preocupa com a evolução do famoso golpe militar, o nosso solitário pescador puxa um peixinho aqui, outro ali e vai colocando numa sacola...

O tempo passa e dai a pouco sente que a linhada agarra e nada de peixe. Fez então pressão na linha resistente e notou que mesmo pesado algo se move agarrado no anzol. Pescador experiente, Doutor Oziel não perdeu a calma e deixou de pescar com a vara pra puxar sua linhada...

Com muito sacrifício e horas passadas, já era pra lá das nove da noite ele consegue fazer com que o chumbo e os anzóis encastoados na linha chegasse na borda da pedra...e então respira aliviado de recuperar toda linha, mas desperta curiosidade o que veio agarrado no anzol.

Puxou o que parecia uma embalagem de plástico, e era, quando bateu a lanterna naquele objeto pensou, em qual porco teria jogado aquilo na água...Colocou o galãozinho de aproximadamente 5 litros de um lado da pedra e decidiu por ali encerrar a pescaria.

Ajuntou a linha, a vara e o saco com os peixes que tinha acabado de pescar e ia saindo quando, voltou pra pegar o galão pescado pela alça lateral, que deveria ser jogado fora do leito do rio... Foi quando notou que por ter colocado o galão de lado, a água saiu e dentro da embalagem algo se debatia violentamente...

Como ele não tinha medo, segundo o próprio, e revestindo-se de uma coragem maior ainda que a natural, bateu a lanterna no galão e pegou-o pela alça e lá vai o nosso pescador em passos largos e tomado de curiosidade....

Entrou no Jeep, tomou direção de casa, ali pelas proximidades da atual rodoviária de Conselheiro Pena-MG, e já escuras as ruas, pois o motor que gerava energia da cidade já estava desligado.

Inteligentemente, colocou mais água no galão de plástico, foi dormir e bem cedo no dia 1º de abril de 1964, bela quarta-feira do primeiro dia D da ocupação Militar do Brasil, o Doutor Oziel chega no Bar do Agenor em frente a Praça da Matriz e diz pra ele que tinha pescado um galão, mas que não abriu, mesmo sabendo que tinha alguma coisa ali dentro...

Nos fundos do bar tinha um reservado, onde os jogadores viravam noites no carteado, por onde corria apostas de tudo... O Agenor curioso que era, chama o Juca do Torrado que arrisca dizer que é peixe que tem dentro do galão... Júlio Português já meio puxado das pingas com limão, diz que pode ser cobra d’água, e ninguém se atrevia em abrir o galão!

Lá fora, vai passando de bicicleta o Zezinho pescador que foi chamado a dar uma espiada no negócio. Ele chegou, balançou o recipiente. Tentou ver o que era ali dentro do que chamou de garrafão e disse: pra saber o que é, tem que abrir, se não vai ficar aqui todo mundo olhando pra isso! – apontou pra vasilha...

Alguém trouxe uma faca afiada lá da cozinha do bar, e o Zezinho passou a cortar o plástico, ajudado pelo Doutor Oziel...

Quando já estava um corte bem completo na circunferência do galão, os dois soltaram a embalagem e na dúvida ficaram a certa distancia, quando todos ali no bar viram saltar no piso, quatro peixes do tamanho do galão, o que ficou confirmado serem traíras que segundo o Zezinho pescador devem ter entrado ali quando filhotes e perderam o jeito de sair, crescendo naquele ambiente...

Só assim foi um alivio geral e todos puderam retornar a sua rotina do dia sem preocupar com o Golpe Militar em Andamento naquele dia 1º de abril de 1964....

É mole?

Eu só tô contando o que de fato vi....

André Almeida
Enviado por André Almeida em 21/02/2017
Código do texto: T5920006
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