"A errada" era a que estava certa
A língua portuguesa nos prega muitas peças. Mesmo algumas pessoas letradas, de vez em quando, cometem algum deslize gramatical. Algumas menos letradas, então, podemos dizer que são verdadeiras assassinas da língua pátria.
Caros leitores comecei este texto com o “cerca Lourenço” acima, para relatar uma pequena história acontecida com Flávio, um amigo de longas datas. Ele possuía algumas casas e pretendia colocá-las para alugar. Para atrair futuros inquilinos bolou a frase: “alugam-se casas” e levou para uma empresa produtora de faixas publicitárias e pediu ao proprietário que providenciasse um orçamento. Tendo gostado do valor orçado, autorizou a confecção da peça, ficando acordado que dentro de cinco dias a encomenda estaria pronta.
Ao retornar no quinto dia, como combinado, o dono da empresa lhe falou que a peça publicitária estava pronta, mas, advertiu ao amigo que a frase por ele deixada continha um grave erro de português e que ele, empresário, havia corrigido. O amigo, que conhece um tanto de gramática da nossa língua pátria, pasmo, pediu ao confeccionador que lhe mostrasse o erro. Este se achando o suprassumo da gramática portuguesa lhe exibiu a faixa com a correção, onde se lia: “aluga-se casas”. Ele passou o verbo para o singular. O amigo contestou lhe dizendo que a frase que ele mandou constar na faixa era a que estava correta; que gramaticalmente ela estava na voz ativa. E que quando fosse passada para a voz passiva, deveria ser lida: casas são alugadas. Ao contrário, se a correta fosse a que ele, empresário, queria, quando passasse para a voz passiva iria ficar: casas é alugada. Mesmo diante dessa cristalina evidência de falta de concordância verbal, ainda houve relutância do homem em aceitar os argumentos. Por mais alguns minutos discutiram quem estava certo ou quem estava errado, sem que o empresário se desse por vencido. Até que o amigo, já meio apoquentado com tal disparate, subindo o tom da conversa, falou: - Cidadão vamos dar esse caso por encerrado. Eu estou pagando e quero que a faixa seja feita com a frase que eu pedi que fosse confeccionada. “A errada”. É Isso que estou lhe dizendo, quero que faça a faixa com a frase que lhe pedi que fizesse: “a errada”. – Repetiu. Sem mais delongas, e, para o bem de todos, a querela foi encerrada.
Permitam-me transcrever a primeira estrofe do soneto "Língua Portuguesa" de autoria do poeta parnasiano Olavo Bilac, que, sobre o nosso idioma, nos brindou com a pérola, abaixo transcrita.
Língua Portuguesa
“Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
{...]”