PARA UMA "LIVRO AULA": Desilusão 3?
Sentado desconfortavelmente em uma sala com o coordenador do curso e vários outros professores, Aquiles acompanhava a discussão sobre o novo currículo que estava sendo montado. Para variar, nenhuma grande mudança tinha sido proposta até então.
Sem exceção, todos ali preferiam concordar apenas com a adoção de novos nomes para disciplinas antigas e também com uma nova periodização para elas. Algo que vinha sendo feito há décadas com uma certa "maestria", mas sem obter muita repercussão.
Tal fato aliás, sempre foi motivo de muita reclamação por parte dos alunos. A maioria nunca viu muito sentido nessas frequentes mudanças "cosméticas", ficando com a certeza que a Universidade acabou se tornando a única beneficiada dessa atitude insana e unilateral.
Após mais de 20 anos lecionando no curso de Administração da Universidade, Aquiles tinha algumas ideias sobre novas possibilidades e formatos de aula. Contudo, tinha muito medo de se expor, já que a maioria não seguia o padrão estabelecido para uma instituição tão conservadora.
Uma dessas ideias era a criação de uma matéria diferente, com o estranho e sugestivo nome de "LIVRO AULA". A disciplina seria baseada em livros de histórias empresariais brasileiras, não importando se de sucesso ou de fracasso.
Ela serviria para estimular o hábito da leitura entre os alunos, bem como a capacidade dos mesmos em expor um assunto de uma maneira mais longa e profunda. Sendo mais indicada para os primeiros períodos do curso.
Cada pequeno grupo ficaria encarregado de ler um livro e montar uma aula inteira sobre ele, com um roteiro geral previamente definido e conhecido. O livro já deveria ser indicado por sorteio na matrícula da disciplina (no final do semestre anterior), que deveria limitar em 39 o número de interessados.
Ao todo seriam 17 encontros (34 Horas-aula). O primeiro para apresentação da disciplina. Os dois seguintes para as duas primeiras apresentações (feitas pelo professor) e os outros 13 para as apresentações realizadas pelos alunos em grupos de no máximo três. E ainda sobraria mais um encontro reservado para a avaliação geral, sem caráter punitivo.
Os livros poderiam ser atuais ou antigos, mas de preferência que não fossem conhecidos pela maioria. A escolha dos mesmos ficaria a cargo do professor e a sua disponibilidade física ou eletrônica deveria ser providenciada previamente pela biblioteca da universidade. Seria bom que o professor já os tivesse lido anteriormente.
Seria adequado também, que cada um dos alunos já recebesse os livros no ato da matrícula da disciplina, devolvendo-os ao final do semestre (se forem físicos). Assim, a formação dos grupos acabaria sendo aleatória, obrigando todos a participarem.
Aquiles respirou fundo e refletiu. Levantou a cabeça e olhou no fundo dos olhos de cada um presente àquela reunião. Pensou em tudo que estava em jogo dentro e fora da instituição e concluiu com melancolia. "Não. Ainda não vale a pena arriscar. Melhor deixar essa droga (sic) para lá. Não vai adiantar nadinha mesmo".
Sorriu meio amarelo e olhou para o relógio pela enésima vez, torcendo para que a hora de ir embora chegasse logo. Afinal de contas, sua cabeça e seu estômago já não aguentavam mais tanta mesmice e tanto medo concentrados em um só momento. "Deus tenha pena de mim". Como na Grécia da Ilíada, aquela comédia parecia terminar em tragédia.