O VELHO VAQUEIRO ( Celismando Sodré - Mandinho)
O VELHO VAQUEIRO
( Celismando Sodré-Mandinho)
E o velho vaqueiro, já há muito tempo aposentado, saiu para ver as paisagens da caatinga, onde, durante muitos e muitos anos, ele campeou. Onde tantas e tantas vezes travou memoráveis batalhas com as reses numa peleja do homem com animal, da coragem contra a adversidade, numa incrível luta pela sobrevivência. Ficou espantado diante do que viu, as lembranças começaram a passar na sua mente como a fita de um velho filme em preto e branco. O velho vaqueiro chorou!! Chorou ao lembrar de como era a vegetação do sertão no seu tempo de labuta; seco e cinza na época da estiagem, mas verde e frondoso na época das chuvas
Agora, a devastação atinge a caatinga como flecha de fogo que também atinge seu coração, ele lembrou de tantas passagens, de tantas experiências em riachos e rios cristalinos, embaixo de árvores que davam gratuitamente suas sombras para o descanso, das inúmeras espécies de pássaros e outros animais, e sua sensibilidade encoberta por tantos anos de sofrimento veio a tona. Um rio de lágrimas desceu dos seus olhos, as perguntas se sucederam numa seqüência incontrolável como as lágrimas que caíram molhando o chão. Onde estão os pés de jatobás, umburanas, barrigudas? Onde estão as codornas, os tatus e as raposas? Meu Deus!! Onde estão os animais que no meu tempo corriam pelas matas? Onde estão as matas por onde os animais corriam? As chuvas estão escasseando e o sertão está virando um deserto. Pensam que desmatamento é só na Amazônia, na Mata Atlântica, no Cerrado, mas é aqui também, em plena caatinga de vegetação complexa e as vezes até exuberante. E o velho vaqueiro em pranto lembrou que tinha filhos, que tinha netos e que poderá ter bisnetos. Ele lembrou que um dia seu pai lhe contou uma história que tinha ouvido do seu avô, “que no dia que o homem, “o bicho homem” acabar com a caatinga e com os bichos que vivem da caatinga, será o dia em que o homem morrerá também de solidão, de fome e com remorso, será a morte mais triste do mundo a do homem, porque, além da dor no coração e na barriga, ele carregará até o último suspiro, a mais terrível das dores, a dor que martela a mente insistentemente... que é a dor da consciência.
O velho vaqueiro ainda em prantos, deu uma última olhada na paisagem e pensou que o homem esta agindo com a natureza como gafanhotos que atacam uma plantação e a destrói, mas... existe uma crucial diferença; os gafanhotos agem apenas pelo instinto de sobrevivência, e os homens se arvoram a serem os mais evoluídos dentre os seres vivos, gritam a toda a altura para quem quiser ouvir: SOMOS RACIONAIS!! E, no entanto, agem como os gafanhotos.
O Velho vaqueiro selou seu cavalo e voltou para sua casa, trancou-se no seu quarto para, em oração, pedir perdão a DEUS em nome de todos os homens. Sua esperança no futuro estava tão cinza, tão embaçada, como a paisagem da caatinga que ele tinha visto. Com as lágrimas correndo nos olhos, Ele lembrou de um antigo provérbio indígena que dizia:
“Só depois que a última árvore for derrubada, o último peixe for morto, o último rio encerrado, só assim vocês irão perceber, homens brancos, que o dinheiro não se come”.
Para todos os vaqueiros e em especial para Joel Pacheco