O QUE OS OLHOS NÃO VEEM...

o coração não sente.


Tio Valério ainda era bem jovem, não devia ter mais que dezoito anos, quando começou a perder a visão. Seus pais procuraram os melhores especialistas em seu Estado, mas a ciência ainda não havia evoluído o suficiente para curá-lo. A doença principiou praticamente sem sintomas, insidiosa e desconhecida. Quando a vista começou a faltar é que se percebeu o quanto a moléstia já evoluíra, a ponto de não ter mais como fazê-la regredir.

Ele era um rapaz inteligente, que gostava muito de estudar e de ler, mas agora ficava longas horas quieto, olhando o vazio. Uma tristeza e uma melancolia profundas iam minando seu ânimo.

Certo dia, alguém de casa lhe deu uma rapadura para comer e ele ficou longo tempo chupando o açúcar, até que perguntou:

“O que há nesta rapadura que estou chupando há algum tempo e não dissolve?”

Mamãe, sua sobrinha, que mal tinha entrado na adolescência, foi ver o que se passava e percebeu que no meio da rapadura havia um besouro.

Ficou tremendamente enojada, mas um agudo sentimento de pena a invadiu e ela lhe disse:

“Tio Valério, é só uma pequena pedra, talvez do próprio açúcar. Dê-me aqui que vou jogá-la fora.”

Foi um episódio que a marcou profundamente. Ali aprendeu que, em algumas circunstâncias, a compaixão pode se sobrepor à verdade.

Muitos anos mais tarde ela me contou esse fato, do qual jamais esqueci.



 
Aloysia
Enviado por Aloysia em 07/07/2016
Reeditado em 31/03/2017
Código do texto: T5690628
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