Bulinando o Gordinho

O Bullying sempre existiu. Só que ele não tinha nome há pouco tempo atrás. E era resolvido com porrada, não com ações judiciais e psicólogos. Essa estória se passa numa época em que a palavra não existia e a maldade corria solta pelo mundo.

Leandro era um adolescente com excesso de fofura e ossos grandes. Mas, apesar de ser uma vítima em potencial de zoações, o sujeito era gente boa e sabia se defender muito bem, dando sempre uma surra em quem zoava com ele. Ele aceitava de boa as brincadeiras que eram feitas e também zoava de volta quem implicava com seus três dígitos na balança. Entretanto havia uma brincadeira em especial que, devido a repetência e amplitude que ia tomando, o fizeram ficar louco.

A piada foi inspirada no seriado “Chaves”. Típica cena onde Nhônho, um personagem gordo, senta-se e todo mundo se levanta, simulando um abalo sísmico no local. Começou com uns três da classe, passou para uns oito, ampliando para doze e num piscar de olhos, a sala inteira entrou na dança. Leandro sabia quem eram os mandantes da bagunça e sempre batia em todos eles antes de se sentar. Podiam zoá-lo, mas a surra já havia sido oferecida com antecedência.

Só que depois de um tempo, Leandro parou de se levantar. Ele era sempre o primeiro a chegar à sala e permanecia sentado enquanto os alunos conversavam nos corredores. Acabando o recreio, ele voava como um raio para dentro da sala e ficava colado em sua cadeira, e a brincadeira perdeu a graça. Os alunos sentiam falta disso, que era tão legal durante as aulas, e tentavam de todas as formas fazerem o gordinho se levantar, mas era difícil demais. Eles faziam desenhos dele no quadro para ver se ele se levantava para apagar, mas nada. Roubavam a mochila dele e colocavam atrás da porta da sala, mas ele esperava calmamente o final da aula para pegá-la. A turma perdeu a razão de viver, visto que a formatura do terceiro ano se aproximava e eles nunca mais teriam um momento sísmico pelo visto. Até um dia em que algo muito legal aconteceu.

Estava a classe toda na aula do Arlindo, professor de Geografia. Os alunos tendiam a fazer muita bagunça na aula do pobre professor e quase levavam ele a um enfarto. A aula transcorria normalmente, quando Elizabeth, a supervisora da escola, chega à porta da sala e interrompe o professor:

- O Leandro é dessa sala?

- Sim – responde o professor, enquanto a turma toda direciona os olhares para ele.

- Seu pai está te chamando no telefone da secretaria.

A turma toda compartilhou um pensamento telepático: Leandro ia se levantar.

O bullinado, esperto, notou que seria zoado quando voltasse e disse para Elizabeth:

- Pode deixar que depois que acabar a aula eu ligo para meu pai. Avise ele para mim.

Elizabeth, que era muito nervosa, aumentou o tom de voz e mandou:

- Ele está te aguardando na linha Leandro, venha atender!

- Essa aula está muito interessante, não quero perder...

- Anda logo Leandro, nenhum pai liga na escola se não for algo grave não. Ele não quis deixar recado então venha logo!

Intimado, Leandro se levantou e já olhou para trás com um olhar vingativo, demonstrando que muita gente apanharia quando ele voltasse.

Após ele cruzar a porta, vários risos começaram perto da mesa de Fábio. Ninguém entendeu o que acontecia, mas ele fez sinal de silêncio e pediu que todos ficassem a postos. Os alunos que estavam mais perto, notaram um Nokia na mão do aluno. Fábio era rico e um dos primeiros alunos da escola a ter um aparelho celular na época. O celular pesava uns dois quilos e tinha apenas a função de telefonar e jogar o jogo da cobrinha. Fabio pelo visto conseguiu ligar para o telefone fixo da escola e mandou chamar o André de dentro da sala de aula, apenas para ver o circo pegar fogo.

Todos ficaram imóveis e a ansiedade corroia a alma da classe, que aguardava o retorno de Leandro. Minutos depois ele voltou, com um ar de dúvida, pois provavelmente quando chegara na secretaria seu pai não estava mais na linha. Ele olhou para a cara dos colegas em pé perto da porta e viu a malícia no rosto deles. Como de praxe, bateu em todos que ele julgou envolvido e se dirigiu a sua carteira, e quando ele se sentou...

Não dá para descrever com perfeição, mas vamos tentar:

Todo mundo pulou ao mesmo tempo. Alguns exagerados jogaram cadernos e mochilas para cima e outros caíram no chão. Até a mais nerd da sala deu um pulinho tímido e um grito. O som foi ensurdecedor e pode ser ouvido por toda a escola. O professor ficou sem entender aquilo e a sua veia na região do pescoço ficou enorme. Ele agarrou uma cadeira e arremessou no armário da sala, amassando-o completamente. Toda a algazarra não durou nem 15 segundos após essa atitude do professor. O silencio reinou e ele já olhou para o grupo de Fábio e falou:

- Sumam da minha frente, se não eu vou fazer a maior besteira da minha vida.

Fábio e uns quatro comparsas saíram correndo da sala e foram parar na sala da supervisora. Ao chegarem lá, Elizabeth nem quis saber o que aconteceu, pois disse que para Arlindo ter perdido a paciência, com certeza eles fizeram algo inadmissível. Deu uma cópia e uma suspensão para os cinco e Leandro se divertia a beça com a punição que eles receberam. A ideia era ofensiva, mas para muitos da sala, aquele momento de união ficou marcado para sempre na memória de todos. E na formatura, quando Leandro pegou o diploma...

Lalinho
Enviado por Lalinho em 28/02/2016
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