A cisterna do João Pica-pau
João Pica-pau é um exímio contador de historias. Quando acabava de se sentar para esperar o começo da reza, na casa de um amigo, um conhecido se dirigiu a ele e falou:
- Conte uma história seu João Pica-pau.
Ele fez uma pausa, como se buscasse na memória, um causo. Achou desta vez, uma historinha bem curiosa. Ninguém acredita, mas bom mesmo é ouvi-lo contar seus causos absurdos que ele garante que é verdade. Depois de se ajeitar na cadeira, começou:
- Certa vez abri uma cisterna na minha fazenda. Não tinha defeitos, nunca vi tanta água, uma verdadeira lagoa. Mas, quis o destino que certo dia passasse por lá um fazendeiro vindo do Pará que, ao ver a cisterna, ficou encantado. Elogiou a obra e me parabenizou, principalmente, em razão da quantidade e qualidade da água. Depois de tantos elogios o homem propôs me comprar a cisterna. Claro que eu recusei, não ia vender minha melhor fonte de água. Mas, quando vi o valor da oferta não tive como recusar. Andava precisando de dinheiro para tocar a fazenda, e logo abriria outra cisterna. O dinheiro oferecido, não era pouco e resolveria alguns dos meus problemas. Ninguém entendia como o homem iria levar a cisterna para o Pará, mas ele levou.
- O que me traiu, disse João Pica-pau, foi à falta de honestidade do fazendeiro, com aquela mania que tem certas pessoas de passar a rasteira e derrubar os outros. Eu confiei nele e acreditei na sua promessa de que me mandaria o dinheiro pelo banco, e lá se foi minha cisterna. Também, o homem era conhecido na região e considerado por todos como uma pessoa direita e muitos me elogiaram por fazer o negócio. Depois riram de mim quando souberam que o homem não tinha mandado o dinheiro. Alguns, como meu vizinho riram, mas, somente pelas costas e longe de mim. Pouca gente, bem poucas duvidavam da desonestidade do boiadeiro.
- Depois que venceu o tempo do dinheiro chegar, fiquei pensando numa maneira de recuperar minha cisterna. Mas, não precisou. Dois meses depois do sucedido, parou um caminhão em frente à sede da minha fazenda. Fui ver quem era. Era ele, o fazendeiro comprador da minha cisterna. Olhei desconfiado para ele com um jeito meio bravo. Minha cara era de poucos amigos. Aproximei-me e perguntei:
-O que o senhor quer?
- Sou a pessoa que comprou sua cisterna
- Eu sei. E não pagou.
E para minha surpresa, ele como que desmoronando, me disse que vinha devolver a cisterna. Achei aquela conversa muito estranha. Ele falou que ela no começo dava muita água, mas depois de um tempo secou. Ele fez de tudo, mas ela continuou seca. Então, eu disse que já estava me preparando para ir buscá-la porque ele não havia mandado o dinheiro.
Estou com ela na carroçaria do caminhão, disse. No final das contas eu tive minha cisterna de volta. Nada me tira da cabeça que ela dera uma lição nele, se recusando a dar água. Tenho certeza que foi por causa do calote que ele me deu que ela secou.
Agora, a cisterna está lá em casa produzindo muita água. Vocês precisam ver que beleza. Todos dão aquela risada. Depois da reza, João vai embora, prometendo voltar no próximo fim de semana.