Apartamento 15

Num dia desses encontros casuais, deparei-me com Gustavo na esquina de casa, ele estava lá entre os carros olhando para minha janela. Gustavo sempre fora apaixonado por motos , e gostava de sentir a adrenalina subindo na pele.

Fiquei umas horas conversando com ele e percebi uma agitação incontida em seus olhos. Seu jeito errado de falar só comprovava minhas suspeitas de sua pouca intimidade com a leitura. Que pena, muita pena!

Indiquei uns livros para ele, mas sabia que era inútil minha tentativa , mas o fiz mesmo assim. Ficamos ali parados meio abestalhados pela falta de assunto, então sem mais delongas tomei-lhe as chaves e peguei a moto para dar uma volta. Deixei que ele ficasse ali sozinho, num vácuo que até eu mesma chegava a sentir pena. Peguei a estrada e fui quase em outra cidade, pelo caminho não encontrei ninguém. O vento soprava meus cabelos e ao mesmo tempo aliviava o calor intenso que fazia. Já era quase onze horas e a noite estava começando a se calar naquela quarta-feira, então percebi que estava com preguiça de voltar e ter que encarar as consequências de minhas atitudes um tanto quanto impensadas. E a essa altura já havia me esquecido que deveria me preocupar com tudo!

Então voltei vagarosamente como quem tenta adiar o inadiável, sabia que ia ter de encara-lo e estava decidida a fazer isso pela última vez.

Voltei, e ele ainda estava lá, sentado sozinho na calçada, encostado na parede com o olhar distante. Desci, devolvi-lhe as chaves e falei tudo o que havia planejado. Não que eu odiasse Gustavo, pelo contrário tinha até um certo apreço. Ele não esboçava reação nenhuma enquanto eu falava! Não faço ideia do que ele pensava...

Entreguei-lhe o capacete e pedi que ele fosse para sua casa ou para um apartamento 15 de um hotel qualquer da cidade, pedi ainda que se fosse de sua vontade que tomasse um café forte ,afinal toda raiva passa depois de um café. E depois? Depois disso nunca mais o vi e acho que agradeço muito por isso!