O desaparecimento da tia Maria
Descendo o imenso Caiari, cortando as belas águas marrons do famoso Rio Madeira, ao cair da tarde, vendo aquele lindo pôr-do-sol que resplandecia na água, sorrindo em uma mistura de vermelho a amarelo, os pássaros voando no celeste azul, parecia que ninguém existia, só o barulho do motor do barco, sentia aquele vento frio da boca da noite, mergulhada nas belezas do anoitecer punha a pensar o que teria acontecido a tia Maria e seu esposo, já se faziam cinco dias que a família orava dia e noite, fazia promessas para todos os santos possíveis e se duvidar até os impossíveis, ora ou outra saía do pensamento para olhar se estava próximo o sítio São Raimundo na comunidade de Guarany, até que os olhos fitaram a velha canoinha no porto, era hora de sair do barco e presenciar o acontecimento que até o momento não entendia.
A primeira coisa após certo puxar de fôlego pela altura do barranco foi soltar como em um grito desesperado:
- Cadê a tia Maria e tio Joca?
Como os olhares respondiam o que todos já sabiam inclusive quem perguntava, soou silêncio, tristeza com direito a lagrimação de olhos, abraços apertados como forma de esperança e fé afinal ninguém sabia onde estavam, mas devia-se logo encontrar uma resposta, como um casal conhecedor da floresta do nada se embrenha na mata e sem eira nem beira desaparece? Todos queriam saber, já se havia pensado em muitas possibilidades, desde terem sido pegos pelo curupira como aconteceu com Anastácia, prima da vó Geralda, a na pior das hipóteses terem sido servidos como prato principal dos jacarés, mas esta foi descartada por saberem nadar e se virar com os animais, mas os corações apertados chamam a conversar sobre as procuras, a noite já vai alta e na cama o sono não vem com tanta preocupação, quando mais uma vez os pensamentos voam, como pássaros que migram, quem sabe tia Maria e tio Joca não tenham sido pegos pela Velha Gola, pois bem se sabe que os dois estavam meios desentendidos antes de irem a mata, tinham brigado por causa do forno emprestado de seu Manoel que não havia sido devolvido, nada tirava a hipótese da velha tê-los pegos e feito cada um acender por várias vezes seu cachimbo, repetindo que não gosta de brigas, de gente mal criada, se ela pega criança que responde aos pais, com certeza pega casal que briga sem motivos, com certeza colocou os dois no saco dela e se não se reconciliaram viraram empregados da velha mexendo o caldeirão dela e não voltarão mais. Enquanto isso a aurora já anuncia o sexto dia de sono intranquilo, mesmo com os pássaros a cantar felizes e as galinhas comerem seu milho fazendo um barulho como música, a manhã era triste não se havia notícia alguma do casal, até que os olhos cheios de tristezas fitaram um vulto longe, no acero do antigo campo, já na entrada do caminho ao Pracuuba, o igarapé, como a esperança é a última que morre, não acreditava em alucinação, e a fé falava alto, eram eles, e esfregando os olhos a certeza prosperou o casal reaparecera trazidos pelos homens que os procurava há dias, as pernas pra que te quero, interrompidas por um Graças a Deus e abraço tão forte que foi além da alma comemorava a volta dos dois, mesmo ainda atordoados já sentados debaixo da ingazeira atrás da casa tomavam água e agradeciam por estarem vivos, seus familiares e amigos os questionavam sobre tantos dias desaparecidos na floresta, mas para o espanto de todos, o que os fez ficarem muitos dias na mata, sem água, sem comida, perdidos totalmente, tendo que bebe xixi para se hidratar não foi a Velha Gola como pensara, muito menos animal desconhecido, mas o danado e velho amigo da floresta, o Curupira, ele que já chateado das arapucas deixadas pelos caçadores se vingou na tia Maria e seu esposo que tinham ido em busca de alimentos para seus filhos e acabaram sendo vítimas do menino peludo e protetor mais fiel da floresta.