não dá pra entender

Sabe aquelas pessoas que fazem tudo errado, o tempo todo?

E aqueles que não se dão bem em nenhum meio ou situação?

Pois é!!!

Sou assim! Sempre fui assim e, creio, nunca deixarei de sê-lo.

Não que não tente ou não queira, mas é complicado!

Sempre que tento me encaixar, me inserir, uma tragicomédia nasce.

Vou exemplificar o que digo:

- Existe um padrão, convencionalmente aceito pela maioria, para combinar cores, utilizá-las em determinadas ocasiões e de algumas formas. Nunca pude ter o privilégio de participar desse consenso, simplesmente porque sou daltônico.

- Lugares preferidos para jogar conversa fora e fazer amizade são bares, boates, danceterias, lanchonetes, churrascos, jantares e almoços, além de outros assemelhados. A complicação, para mim, nesses casos, é o fato de eu não beber uma gota de álcool, ser vegetariano, não dançar e não poder comer além das quatorze horas, por conta de um problema orgânico. Simples, não?

- Eventos esportivos são outro mote para enturmar, criar oportunidades de entrosamento ou conquistar simpatia; e também obstáculos naturais para alguém como eu, tão pouco afeito aos esportes e nada interessado em acompanhar a evolução de competições várias. Tentei participar de eventos, contrariando minha natureza, e em uma ocasião consegui, num jogo de futebol, marcar dois gols contra e ser expulso de campo, por jogadores de meu próprio time.

- Por falar em competição, também não comungo do desejo da maioria de meus conviventes, que se batem por conseguir bom emprego ou elevada posição social. Nunca suportei competir com ninguém, e quanto a empregos, nunca os tolerei por diversos fatores, mas principalmente por ter encontrado, ao longo de minha existência, chefes ou superiores tão estúpidos, que ao me defrontar com suas ordens ou atitudes, duvidava até de minha sanidade mental. Certa vez houve uma greve, que atingiu quase a totalidade dos servidores que trabalhavam no mesmo setor em que eu estava lotado. A greve só não foi total porque “eu” fui trabalhar. No dia seguinte, fui despedido da empresa, por justa causa, como grevista (era proibida a greve, no tempo da ditadura). Fui o único a ser despedido e taxado de grevista. Dá pra acreditar?

- Fiz um acróstico para a primeira namorada (poema em que a letra inicial de cada verso forma o nome da pessoa a quem se dedica a inspiração). Ela o leu, riu muito e disse ser até bonitinho, mas que aquilo era coisa de boiola e que preferia atitudes mais viris.

- Pouco depois comecei a namorar uma menina num sábado, à hora do almoço. Ela contou que sua família proibia namoros, motivo pelo qual teríamos de evitar dar bandeira. Saímos de mãos dadas e, após dois quarteirões, vimos passar três carros lotados de gente, todos seus familiares (incluindo seus pais). É óbvio que o namoro acabou alí, mas escapei da surra por ter pernas compridas.

- Ensaiei uma carreira artística, e quando estava cantando em um festival de música (ao tempo do colégio), a apresentadora do evento simpatizou comigo. Sempre fui muito tímido, e embora contente com o flerte, fiquei sem ação, mas ela tomou minha mão, quando saí do palco, e continuou caminhando comigo. Estava gelado e meus sentidos travaram. Não deu outra! Após caminharmos um pouco, distraído e enlevado como estava, dei de cara em um poste e, ainda segurando a mão da garota, caí (meio tonto) numa poça de lama, puxando-a junto e fazendo com que se enlameasse, solidariamente. Em meio a risadas, levei alguns sopapos e nunca mais recebi sequer um olhar caridoso da companheira de infortúnio.

Qualquer pessoa, minimamente informada, sabe que muitas atitudes que são adotadas pela grande maioria, podem ser ridículas, anacrônicas, infantis, cruéis ou até loucas. Porém, por mais absurdos que possam ser e parecer tais procedimentos, são perpetrados, como já disse, pela maioria, o que os torna, automaticamente, bons, corretos, normais e comuns, para essa mesma maioria.

Eu não estou com a maioria.

Eu não estou nem mesmo com a minoria.

Estou só, nu, pelado e tentando por a mão no bolso, pra frisar o desamparo.

Por conta desse modo de ser, meio excêntrico e meio desajustado, sou sempre o esquisitão do pedaço. Se tento ser simpático, desconfiam de minhas intenções; se me recolho, sou arrogante; se brinco, descobrem inconveniência em minhas atitudes e se pergunto algo, sou intrometido.

Em certa ocasião, inadvertidamente, resolvi contar uma piada (o que foi uma iniciativa infeliz) e tentei elaborá-la o melhor que pude, mas além de não conseguir sequer uma risadinha, ainda vi alguns bocejando de tédio, enquanto me esforçava por ser engraçado. Algumas horas depois, na mesma ocasião, no mesmo evento e perante as mesmas pessoas, outro convidado contou a mesma piada, gaguejando e titubeando, porém, obtendo um êxito estrondoso.

Depois de tanto sucesso, enfiei a viola no saco e fui cantar noutra freguesia.

nuno andrada
Enviado por nuno andrada em 21/07/2015
Código do texto: T5318953
Classificação de conteúdo: seguro