Vida na roça
Todo final de tarde, meu pai voltava cansado do trabalho na roça: enxada no ombro, cabaça pendurada e um saquinho de algodãozinho no qual ele levava farinha e rapadura para as refeições.
Nos pés rachados, trazia a terra da roça, nas canelas finas, os arranhões dos matos, nas mãos mais calos, pois a cada dia suas mãos pareciam mais ásperas, no olhar, a esperança de poder alimentar os filhos com o que a roça produzia.
Sentado na pedra do terreiro, pedia um gole d'água, mas no cair da tarde a casa já estava escura, eu tinha medo de ir buscar água. Ele ralhava, eu entrava na casa, metia o caneco de alumínio no pote e saia com a água bem geladinha, ele bebia e dizia que essa água era a melhor que tinha bebido.
Ficávamos calados, nós, nossa mãe e avó sentados nas pedras. Eu voltava pegava uma cuia d'água, lavava os pés de meu pai.Minha mãe entrava em casa trazia uma panela de mungunzá com feijão e carne de porco, colocava a janta de todos. Só se ouvia a colher bater nos pratos de ágata...
Depois, minha avó vinha com o alguidar e um pedaço de sabão da terra, uma bucha de maxixe e mandava uma de nós lavar os pratos.
Meu pai deitava-se na pedra, cochilava. Nós não podíamos falar para não acordar papai.
Mamãe acendia uma lamparina e mandava todos dormir, para não acabar o gás...todos entravamos em fila e pulávamos na tipoia:
- Com jeito, meninos, pro mode num rasgar a fianga.
- Bença, pai, bença, mãe, bença, vó...
No escuro, muitas assombrações vinham povoar nossa mente, mas ninguém ousava dar um piu, se não ficaria sem jantar no outro dia, pois essas assombrações, segundo nossa avó, era etombo pesado.