= Meio-Quilo =
Meio-Quilo foi de longe o cara mais mentiroso, embrulhão e enrolão que eu conheci.
Tipo desses que dão nó em pingo d'água.
A todos conhecia, a todos os lugares tinha ido, já tinha feito...
Empresas em que dizia já ter trabalhado, se somasse o tempo dava uns duzentos anos, pelo menos.
Media no máximo um metro e meio. Magro do vento carregar. Daí o apelido.
Feinho padaná. Tipo esses bichinhos que se ganha juntando dez tampinhas ou selos de qualquer coisa.
No trabalho, quem era escalado para trabalhar com ele, ao ver a escala, já coçava a cabeça, sabendo que ia ter que trabalhar por dois.
Se fosse uma equipe então, daí que ele enrolava a mais não poder, sumindo do serviço, "voando" mais que a Zazá
Nem o deixávamos falar. Mal abria a boca alguém ou todos em coro diziamos: Xiiii! Lá vem mentira! Cala a boca Meio-Quilo!
Como dizem, não existe panela sem tampa, pelo menos ao sair da fábrica, um dia Meio-Quilo arrumou uma namorada.
Feinho também, mas perto da feiura dele, uma miss.
E ele todo empolgado. Fazendo planos pra casar, dizendo que ia construir uma casa num terreno que tinha num bairro chique da cidade, terreno esse que sabíamos ele nem tinha. Nem lá nem em outro qualquer. Era pobre de marrédeci, o coitado.
E nós o incentivavam os dizendo: Isso! Case mesmo! E logo! Se perder essa, outra louca nunca mais!
E ficávamos imaginando as mentiras que ele devia estar contando pra coitada da namorada. Pobrezinha .
Algumas mentiras eu fiquei sabendo porque ela morava perto da minha casa e eu conhecia toda a família dela. E ele sabendo disso, vivia me pedindo pra fazer a moral dele com a família dela caso alguém perguntasse dele.
E eu dizia: - Podexá, Meio-Quilo. Vou fazer um H de ti lá se alguém perguntar de você. Tudo que não quero nessa vida é que você morra solteiro.
Um dia, durante uns goles num boteco perto da minha casa, um tio dela me disse: - Fiquei sabendo que o Joãozinho, esse rapaz que minha sobrinha Maria do Carmo tá namorando trabalha com você. Boa gente ele né?
E eu: - Sim. Muito boa gente!
E ele, o tio: - É verdade que ele está pra ser promovido? Que só está esperando um
chefão lá se aposentar pra assumir o lugar dele?
E eu, me torcendo pra conter o riso: - É verdade!
E o tio continua: -É verdade que ele está pra ir fazer um estágio na Alemanha?
Eu: - É verdade.
O tio: - Ele prometeu trazer pra nós umas camisas do Bayern...
Eu: - Prometeu é? Que legal! Vou pedir uma pra mim também, então.
Voltei pra casa pensando... Esse Meio-Quilo não tem jeito...
No dia seguinte fui obrigado a contar pra turma na empresa.
Caímos na alma dele como sempre, a cada mentira descoberta.
E ele ria e dizia: É mentira do Beto. Não sei de onde esse cara tira essas histórias!
Pode? No fim o mentiroso era eu.
Ao que alguém disse: - Eu acredito no Beto! Lembra que esse fdp mentiu pra nós que trabalhou um ano na ABB da Suíça? Nem na ABB daqui. Nem um dia. Nunca passou nem perto. Nem sabe onde fica. Suíça então nunca viu nem no mapa!
E ele ria e dizia: -Vocês são tudo maluco!
O namoro não progrediu como o esperado. Não demorou muito pra Maria do Carmo e família descobrirem o quanto 171 ele era.
O que zerou a conta dele foi quando descobriram que as flores que vez em quando ele levava pra namorada e pra sogra, eram "compradas" num cemitério também aqui próximo, o Parque dos Ipês.
Depois, contrariando o ditado de que "o raio não cai duas vezes no mesmo lugar", conseguiu outra namorada e casou.
E três anos depois, três filhos. Duas meninas e um menino.
Que graças a Deus, saíram todos parecidos com a mãe.
Lá do andar de cima onde mora a algum tempo,
deve estar rindo e dizendo :
- Acreditem nesse cara não! O Beto é muito folgado!
Eu, né?
Deus o tenha, Meio-Quilo!
Grato pelas risadas e gargalhadas que
nos proporcionou e pelos tantos
momentos bons e divertidos
que passamos juntos.
= Roberto Coradini { bp } =
07//07//2015