O astrólogo e seu horóscopo

O ASTRÓLOGO E SEU HORÓSCOPO

Miguel Carqueija


“Virgem — de 22 de agosto a 22 de setembro — para você, o dia é ótimo para negócios. Tome cuidado com pessoas de Escorpião, Sagitário e Leão. Dia bom para assuntos sentimentais...”
O Raimundo Gumercindo — perdão, o grande Professor Tagore — parou de escrever o horóscopo, porque alguém surgiu pela porta entreaberta do seu gabinete.
— Posso entrar?
— À vontade, moça. Sente-se.
A moça agradeceu e sentou, fitando o astrólogo em sua escrivaninha.
— É o Professor Tagore?
— Ele mesmo. Olhe, se quer o meu anuário astrológico eu não o tenho aqui para vender; ele pode ser encontrado nas bancas.
— Não é bem isso, professor. Vim fazer um pequeno pedido.
— Um pedido?
— Sim. Professor, eu sou de Libra, e há seis meses atrás o meu horóscopo que o senhor escreveu disse o seguinte: “Hoje, Libra, se você é jovem e sem compromisso, esta é a sua GRANDE CHANCE de encontrar o amor da sua vida. A conjuntura é muito favorável: APROVEITE-A.” Bem, eu APROVEITEI. Conheci um rapaz encantador, fiquei caída por ele e fizemos um namoro-relâmpago. Um dia, há quatro meses — estávamos de casamento marcado e íamos preparar a casa — ele veio com uma história de que havia perdido o talão de cheques e pediu-me o dinheiro — uma nota daquelas — para resolver tudo naquele dia. Depois me devolveria. Bem, eu entreguei — meu horóscopo estava dizendo: CONFIE NA PESSOA AMADA. Sabe o que ele fez? Viajou para as Filipinas e me deixou este bilhete:
Passou-o para tagore, que leu a seguinte frase: “Querida, desculpe. Você é muito boa, mas o seu dinheiro é melhor ainda”.
A moça prosseguiu:
— Estou com os recortes de jornal e com os documentos que provam a data do meu nascimento. Veja-os.
Bastante encabulado o professor olhou e perguntou:
— Bem, afinal o que a senhora deseja?
— Ainda pergunta? O senhor é o responsável, logo terá de me pagar o dinheiro que eu perdi.
— Mas, moça, eu não tenho culpa nenhuma! O seu horóscopo fala de uma grande chance de encontrar o seu amor, e uma grande chance não é uma chance total. Sempre existe uma certa margem de incerteza...
— E como é que o senhor sempre diz: “Os astros não mentem jamais”?
— Bem, eles não mentem. O astrólogo é que pode se equivocar um pouquinho na leitura...
— Se o senhor se equivocou “um pouquinho”, pague-me o equívoco!
— Não há lei que me obrigue a isso!
— Não?
— E outra coisa, moça: afinal por que esperou quatro meses para vir se queixar?
Ela sorriu e se ergueu, encarando o astrólogo:
— É que antes de vir eu resolvi tomar umas liçõezinhas de caratê...

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Mais tarde, no hospital para onde foi removido depois que reconsiderou e indenizou a queixosa, o Professor Tagore, apesar de tudo, continuou firmíssimo nas suas convicções:
— Afinal de contas, o meu próprio horóscopo de hoje estava mesmo dizendo: cuidado com a sua saúde!


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