A ERA DOS BISNETOS DO CHICÃO
Um senhor com mais de 60 anos de idade e que mora sozinho, tem o costume de, aos domingos, antes da refeição, tomar uns traguinhos de pinga.
Após abastar-se nos alimentos, sente-se sonolento e debruça por ali mesmo sobre a mesa.
Como a residência oferece relativa facilidade de encontrar alimentos, os ratos se aproveitam disso e também se fartam.
O rato mais ousado foi denominado Chicão e passou a ser tolerado por esse senhor.
Chicão aprendera a bebericar ainda jovem, quando, percebendo que o vovô encontrava-se apagadão, após umas e outras, aproveitava-se para degustar da marvada. Achava aquela sensação estranha mas muito prazerosa e divertida.
No início, quando o idoso percebia a visita indesejada do então desafeto rato de telhado, perseguia-o atirando-lhe paus, pedras e instigava o cachorro para que o apanhasse e o matasse.
O tempo foi passando e a presença daquele sorrateiro rato de telhado passou a não incomodar mais, a ponto de ser servido com algum petisco. Afinal, tratava-se da única e fiel companhia.
Porém, como tudo passa, o Chicão também passou. Passou desta para melhor, deixando seu afetuoso amigo novamente só.
Foi-se um ser cuja amizade, embora inusitada com um humano, fora de muita proximidade. De tal forma que ambos compartilhavam da mesma mesa e da mesma pinga.
Contudo, durante sua existência, Chicão com sua ratazana preferida, deixou dezenas de sucessores. Estes, por sua vez, geraram outra e mais outra geração de roedores, apontando a árvore genealógica, em relação ao Chicão, como sendo os bisnetos deste.
E os bisratos em sua numerosa ninhada estão se sentindo no paraíso. Têm trânsito livre por todos os lados, sem qualquer ação ameaçadora, a não ser a do labrador, que se alvoroça em vão, na tentativa de abocanhá-los.
No sábado, 28 de fevereiro de 2015, a prova maior da fidelidade do vovô à descendência do Chicão. Parecia até que foram todos convidados para a festa de aniversário do sexagenário. E, como toda criança sadia, fizeram a maior farra. No jargão popular, “fizeram a festa”.
Como havia muitos convidados humanos, os pequenos mas numerosos roedores não se atreveram a se aproximar. Todavia, corriam de um lado ao outro da goiabeira e de galho em galho, zombando dos convidados humanos, presentes à comemoração e deixando alguns em pânico. A outros, serviram de curioso entretenimento.
Fossem os camundongos humanos, daria até para imaginar o que se passa na cabeça deles:
“Viva o vovô apagadão, agora é nóis!”