DANÇANDO NO BREJO

Série: Causos do Interior

Ghiaroni Rios

À noite saímos pra mata para uma caçada de tatu. Os cachorros de caça do Chichico eram bons.

Um grupo grande, uns quinze caçadores. Espingardas, lampiões, lanternas, foices, enxadões, facões.

Mário pegou emprestado um caminhão, um velho Chevrolet ano 1961, do primo Fausto. Em frente a casa de tia Sinhá, em cima do caminhão, a foto mais parecia de um bando de Sem Terra preparando uma invasão.

No local da caçada, uma grande lona foi armada mesmo na estrada para o acampamento. Não passava mesmo carro naquela estradinha que margeava a grande mata na Fazenda Progresso.

Subimos o bando por uma picada no meio mata, de uns dois metros de largura. Os cachorros à frente “trabalhando”.

Esperando a hora boa para caçar tatu, o acampamento improvisado virou uma festa. Uma pequena vitrola movida a pilha tocava bossa nova no long-play, o famoso bolachão. Martini branco e cachaça eram tomados no bico, com a garrafa passando de mão em mão.

Na caçada com cachorros que ‘levantam’, desentocam a caça, eles vão à frente procurando através do aguçado faro e o dono interpretando os latidos e estumando, incentivando. No meio da mata Chichico parou todos e deu o tom:

"eles acuaram, vamos na direção, mas em total silêncio."

Imagina um bando daquele, à noite, tontos, em uma mata, fazer silêncio absoluto.

Antes, no acampamento Mário determinou (Mário determinava ninguém discutia, fazia.) a Nairobi:

"-vai dançar twist!"

A dança da moda, o twist, movimentava muito as pernas, exigia equilíbrio e Nairobi, como todos, estava tonto. Errou a passada, despencou barranco abaixo caindo em um brejo com cabeça e tronco enfiados na água e lama. Foi socorrido pelos fundilhos das calças, quando então respirou aliviado.

Valentia e coragem se vê na hora h, na precisão. Quando o bando estava a uns trinta metros dos cachorros com a caça acuada, Chichico deu outro sinal de parada e juntaram-se todos em torno dele.

"-conheço bem meus cachorros, isto não é acuado de tatu não, é de onça!"

Palavra mágica: ONÇA. O bando desandou em correria no sentido contrário aos cachorros, pela picada, perdendo pelo caminho, lampiões, lanternas e tudo o mais. A correria só parou no acampamento.

O Porrocha, recuperando o fôlego sentenciou:

"Cê viu o tamanho da onça, uma pintada e estava com cria!"

ghiaroni rios
Enviado por ghiaroni rios em 10/02/2015
Reeditado em 05/02/2018
Código do texto: T5132219
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