A VILÃ
A fila estava grande, como sempre. Virava o quarteirão e Adão chegara ali às quatro horas da manhã.
Mulheres grávidas, cadeirantes, cardíacos, pessoas com espinhela caída, coluna torta, loucos e alucinados, todos a espera para abrir os portões do instituto.
Dali a pouco enfrentariam a guerra com a tropa de choque dos funcionários públicos, alguns com suas caras de merdas, suas burocracias seus ataques de indiferença.
“Epa, momentos de tensão um jovem tem um ataque epilético, se contorce metade do corpo no passeio a outra na sarjeta começando a babar”, alguém grita;
--cai fora que a baba contamina.
Todos se afastam caindo uns sobre os outros com medo da terrível baba epiléptica. Chega um guarda com cara de sono, olha meio receoso para o jovem e vira-o com pé, pois em seu treinamento lhe ensinaram que nestes casos vira-se a pessoa para ela não engasgar com a baba marvada, ele coloca a coberta enrolada que cobria o jovem como escora em suas costas e vai para o seu setor.
Uma velhinha pergunta;
-- O senhor não vai socorrê-lo ou chamar o medico?
Ele da de ombros e diz;
--Senhora, aqui não tem medico não aqui só tem perito.
---Mas perito é medico seu guarda; fala ela.
---Guarda não, vigilante por favor e perito só pericia não “clinicá.”
--A faça me o favor. Grita ela;
Ele senta-se na sua cadeira e recomeça a ler o jornal do dia anterior que na capa dizia;
‘’HOMEM MORRE NA FILA DO INSS.
A velhinha meio que desiludida olha para Adão e resmunga;
---É estamos fritos, estamos nas mãos dos homens.
Adão com suspeita de câncer na boca também resmunga;
---justo, justo justo...
E a infinita fila começa a andar.