PIAZINHO

PIAZINHO

Papanduva, Santa Catarina, um piazinho chega na bodega arrastando um chinelo maior que seu pé, calção puído e uma camiseta de manga comprida e estampa desgastada pelo tempo. Ele está sujo de terra. O nariz escorrendo.

A bodegueira abriu um sorriso ao ver o piazinho. Já o conhecia, morava na casa da frente.

O piazinho caminha rápido, seus passos firmes ecoam no assoalho de madeira da bodega vazia. Cara de sério. O piazinho gostava de brincar na terra. O piazinho não iria se perder para voltar para casa, como num conto de fadas ele deixou um rastro, em vez das migalhas de pão, terra e barro desgrudavam do chinelo.

A bodegueira acabara de varrer o assoalho e olha os pelotes de barros que o piazinho deixava. Não diz nada.

Enquanto caminha em direção ao balcão o piazinho ergue seu braço direito e na altura do cotovelo encosta a manga da camiseta no nariz e desloca o braço até o punho, sempre rente ao nariz. O nariz ficou limpo, a camiseta ficou um pouco mais suja do que já estava.

A bodegueira fica olhando ele se aproximar. Primeiro ele coloca as mãos no balcão, só dava para ver o cabelo loiro, liso e penteado para o lado esquerdo, no estilo “vaca lambeu”. O piazinho na ponta dos pés se esticando todo para ver a bodegueira. Os olhos azuis surgem atrás do balcão e junto aquela cara redonda e sisuda do polaquinho. Parece bravo.

A bodegueira pergunta amigavelmente:

- veio visitar a titia???

O piazinho não deu trela e não respondeu. Jogou as moedas que trazia numa das mãos em cima do balcão e disse atropeladamente:

- quero “frórfos”!!!

A bodegueira sorriu com a pronúncia enrolada:

- hã?? o que você quer??

O piazinho continuou sério, arregalou os olhos azuis, enrugou a testa e respondeu alto e devagar:

- Q U E R O "F R Ó R F O S"!!!

A bodegueira não controlando o sorriso entregou uma caixa de fósforos e também umas balas de brinde. Iria falar que era para dividir a bala com os irmãos, mas não deu tempo. O piazinho de cara fechada, sério, de três anos de idade, pegou a caixa de “frórfos” e as balas, não agradeceu, não disse nada e foi embora arrastando o chinelo que ainda continuava deixando rastro.

Dizem que o piazinho, hoje um mocinho de mais de 40 anos, continua falando enrolado, ele discorda, só concorda que é um pouco sério.

Juvenal Tiodoro
Enviado por Juvenal Tiodoro em 08/10/2014
Código do texto: T4992041
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.