O FUMO DE ARAPIRACA (E SEU JOÃO QUEBRA QUEIXO)

O FUMO DE ARAPIRACA( E SEU JOAO QUEBRA QUEIXO)

Um final de semana sem brilho e quase sem o cantar dos pássaros. Seu João Quebra Queixo amanheceu no domingo com as vincas do rosto mais profundas. Tinha morrido no sábado um de seus

leitões mais gordos, talvez picado por cobra. Ele estava furibundo neste domingo, quase sem sol, parecendo obra do capeta. Com a cara fechada tomou seu café puro, quente e forte. Não quis carne seca, nem tapioca. Ele dizia que café era como mulher, só prestava quenta, forte e fogosa. Calçou as alpercatas de couro cru, tirou do canto da parede o seu cacete de jucá, árvore dura como ferro. Colocou o chapéu de palha na cabeça, o embornal no ombro e saiu andando a esmo em direção à Amontada. Ia contra o vento que aqui e ali dobrava as abas do seu chapéu. Ele estava possesso e neste dia brigaria, se preciso, pensando no leitão que perdera. Como andava ligeiro, todos sabem, acompanhou dois homens que avistou de longe. Aproximou-se e viu que era o João

Malaquias e o Pedro Serafim que iam em direção ao açude Poço Verde. Seu João aproximou-se e perguntou:

-Pra onde vão Pedro e João.?

- Vamos pescar de anzol no açude, seu João. Já temos as iscas.

-Seu João retrucou, eu tambem vou. Estou com raiva e a pescaria pode me trazer a calma.

-Mas seu João o senhr não tem isca e nem anzol, disse o João Malaquias.

-Eu preciso lá disso João. Tenho meu jeito de pescar

Bom, foram caminhando e com mais 3km chegaram ao açude. Seu João

já com uma masca de fumo de Arapiraca, das Alagoas, na boca. O fumo de Arapiraca era conhecido em todo o Nordeste por seu cheiro, ser forte e bom para se mascar ou fazer um cigarro pé-duro na palha do milho. Chegaram ao açude e foram se acomodando. Seu João olhou para um lado e outro. Observou as águas que brilhavam à luz do sol.

Pediu para os dois amigos irem para mais distante um pouco e ficou na margem do açude, num ponto onde diziam ser menos piscoso.

Sentou-se sobre quatro tijolos crus, com o cacete na mão

Mascou o fumo e jogou a golda na água. Logo os peixes vieram e engoliram a golda embriagadora e mergulharam. Eram três traíras grandes que voltaram para cuspir o fumo e seu João mais do que depressa, zás trás, sentou o cacete e recolheu as traíras. E assim foi jogando masca de fumo e lá vinha piau, carás, curimatãs e bagres. E Seu João cacete neles. Já ia nesta labuta por meia hora com 4o traíras, 50 carás que é peixe besta, 30 piaus e um sem número de bagres

Pescaria das boas devido o fumo de Arapiraca e a sua perícia em manejar o cacete de jucá. O pobre do João Malaquias e do Pedro pouco tinham pescado. Os anzóis não funcionavam.

Nestas alturas do acontecimento a praça do mercado, onde seu João contava a sua história, estava repleta de ouvintes, inclusive o Zé Capote que, como se sabe , não perdia uma. E o pobre do Zé foi cair na besteira

de perguntar:

-Mas seu João como o senhor matou de maneira tão fácil estes peixes?

Eles ficaram embriagados com o fumo?

-Não Zé, embriagado estava você na festa do Zé Migueliin e tão embriagado que se borrou nas calças. Zé, estou achando que você está zombando da minha palavra e por isso vou lhe mostrar como se racha o quengo de um cabra ruim como você e vai ser agora com este cacete. E

veja que naquele dia peguei mais de 100 traíras, 150 carás, 80 piaus, e 120 bagres.

Foi um alvoroço para salvar o Zé das mãos calosas e do cacete do seu João Quebra Queixo, cuja raiva aumentou e disse.

-Zé ainda te pego e te mando para o dr. Mingueira cuidar do teu quengo, se você não morrer antes com a pancada, cabra ruim. O Zé suava frio, mas tudo se acalmou. Pedia clemência e a ajuda de todos.

Seu João afirma que o fato se passou em 1940, em plena Segunda Guerra Mundial e quando não havia ainda nem o açude Poço verde.

Antonio Tavares de Lima
Enviado por Antonio Tavares de Lima em 26/09/2014
Reeditado em 30/10/2014
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