MUNDO VELHO SEM PORTEIRA

Quem sempre viveu na cidade, quem nunca criou galinhas no quintal, quem nunca comeu cambuquira com ovo, quem nunca alimentou porcos, quem nunca tirou bicho-do-pé (a coceirinha é uma delícia!), quem nunca matou uma cascavel na porta de casa, quem nunca colocou lombriga pelo nariz, quem nunca usou uma moita para coisa intima, quem nunca se limpou, ou melhor, rebocou com palha de milho ou folha de mamona, quem nem sabe do que estou falando, talvez desconheça a importância de uma porteira.

É inocente leitor, porteira, prá quem vive ou viveu na zona rural, é coisa séria.

Tão importante que, assim que uma criança nasce a parteira lhe diz no ouvido o mantra que ela vai ouvir para o resto da vida:

“"Não se esqueça de fechar a porteira."

Porteira aberta é sinal de animais no carreador, na "reta", (você não sabe o que é "reta" não?), que precisam ser reconduzidos aos limites da propriedade.

Pois bem!

Eliezer, (hoje eterno ao lado esquerdo do Criador, porque ao lado direito sei muito bem que nunca se sentaria!), certa vez nos surpreendeu.

Meu pai adoeceu e todos os dias, a quase todas as horas, recebia visitas.

Muitos desses visitantes deixavam a porteira aberta.

Mas foi por pouco tempo.

Um dia, um visitante chegou ao sítio e encontrou a porteira fechada, (como sempre), abriu-a e entrou.

Mas assustou-se com um túmulo de terra logo ao lado: será que teria chegado atrasado?

Um túmulo como antigamente, morrinho alongado, numa ponta uma cruz e uma plaqueta, na outra um vaso de flor e uma vela.

Teria morrido o senhor Sajob?

Achegou-se respeitoso à cova, chapéu nas mãos apertadas no peito e leu na plaqueta amarrada na cruz cristã:

"“Aqui jaz a última pessoa que deixou a porteira aberta. Que o Senhor tenha piedade da sua alma.”"

Eliezer nunca mais teve que deixar sua doce tarefa de enrolar cigarros de palha para arrebanhar gado alongado.

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Obrigado pela leitura.

Sajob - junho / 2014