O VELHO E A CADUQUICE
O Velho e a Caduquice
“ Hoje usa-se uma palavra científica: Mal de Alzheimer. Antigamente era CADUQUICE. Os velhos perdiam a memória. Há, inclusive, uma triste e curiosa doença da memória: ela guarda o que aconteceu há muitos anos e não guarda o que foi dito alguns segundos antes." Lembro de uma conversa com minha tia já velha, era uma conversa sem jeito porque ela ficava repetindo perguntas que havia feito menos de um minuto antes, mas sua memória se esquecera não só da pergunta como também da resposta, e era inútil responder, porque a mesma pergunta seria feita de novo. ” (Rubem Alves).
Os meios de comunicação, embora obcecados pela catequização consumista, acabam, em “Off”, levando as pessoas à reflexão sobre os males que atingem esta Criatura moldada à imagem e semelhança de seu Criador. E entre os males está a CADUQUICE. Atualmente uma renomada emissora, inseriu em sua trama um personagem que começa a sentir as conseqüências dessa doença.
Mas eu sou contador de “causos” e não vou ficar sem deixar o meu testemunho dessa importante fase da vida. No passado, pouco distante, o sertanejo estava também sujeito a esse mal. Meu personagem chamava-se João Esposo, pai de Zé Esposo, marido de “Sabenedita”, famosa parteira na Água da Lagoa e cercanias.
Seu João era carpinteiro afamado. Fazia tudo que se pudesse imaginar usando como matéria prima a madeira. Aos 84 anos, embora miúdo e de corpo enxuto, livre de gordurinhas, ainda pegava empreitas na lida em que era considerado “Mestre”. (atenção A Semana: cont. na próxima edição)
Seu Hilário, morador da mesma Água, resolveu entrar no ramo da produção de cachaça, mercadoria de demanda elevada em casas dos roceiros e botecos dos “patrimonhos”. Partiu para a execução do projeto e uma das peças mais importantes do empreendimento era o COCHO, vasilhame destinado ao processo de fermentação da garapa. Madeira era o que não faltava, mas tal apetrecho requeria um tronco avantajado. Paineira era a solução, não só pelas medidas exigidas, mas também por ser macia e fácil de trabalhar. Devia ser em peça única, como era de costume, e de tamanho que comportasse pelo menos 5 mil litros de garapa. Quatro juntas de bois arrastaram o grande tronco ( 8 m de comprimento e diâmetro de 2,5 m) e o deixaram em frente à casa do carpinteiro na sombra de uma gigantesca Santa Bárbara. A obra não tinha prazo para entrega, mas também não podia acompanhar a pouca pressa exigida na construção de capelas.
No dia seguinte munido de uma escadinha, uma enxó, um bom formão e um pesado macete, subiu no topo do solitário tronco. Não podia deixar de lado uma moringa com água acompanhada de uma canequinha de alumínio e mais um bom pedaço de fumo de corda, “uma cabeça de paia de mio”, um canivete e uma binga.
Sem alarde a obra começou com a retirada de grandes cavacos. Com paciência de monge, o trabalho foi sendo executado, sempre de cócoras, postura preferida pelos caipiras e,no caso deste, favorecido pelo tipo físico . Os dias foram passando. Só parava em dia de chuva pesada. Quanto mais a obra evoluía menos do carpinteiro se podia ver. Sumiram as pernas, depois a cintura, os braços acompanhados dos ombros, a cabeça e por último o cocuruto do chapéu. Depois só a fumaça do cigarro de palha e os cavacos que eram descartados um a um. Ouvia-se além do ruído da enxó e do macete, uma enfadonha canção de cunho religioso: “...no céu, no céu, como minha Mãe estarei...”
Certo dia, Seu Hilário que passava com freqüência para fiscalizar o andamento da obra,encontrou o artesão sentado num cepo com os cotovelos apoiados nos joelhos e o queixo apoiado nas mãos, numa postura de absoluta e profunda tristeza. Indagado do motivo de tal desânimo, respondeu com voz sumida: “...VAROU NA GRAMA!!!” (oldack/09/04/014). X Nota do Revisor: Meu caro oldack, só hoje dia 12 do corrente, tomei cnhecimento do seu "causo". Posto que atrasado, creio que se você tinha compromisso com o jornal já deve ter publicado, mas fiz alguns reparos mesmo assim .Se o seu personagem quisesse usar enxó com "ch",creio que o cocho seria cavado do mesmo jeito, mas como não é você que vai usar o instrumento em questão porque seu instrumento é outro bem mais leve, embora não de mais fácil mnuseio, prefira enxó com X ,que até pode lembrar o cabo da dita cuja. Um abraço.
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