"O Velho do Rio" (Causos do Vovô)
Causos do Vovô.
O Velho do Rio.
Meu avô que Deus o tenha, sempre tinha uma história interessante pra nos contar: Dizia ele;__”sabe filho, hoje eu estou me lembrando do finado Salustiano, que morreu afogado nas águas do rio Gavião; depois do acontecido, ele passou a ser conhecido aqui no sertão pelo nome de “O Velho do Rio”. Todo mundo por aqui em toda essa redondeza já viu o Velho do Rio sempre do mesmo jeito, de chapéu e uma capa que escorava as neblinas do mês de junho na barranca do rio, ou mesmo dentro de sua canoa; era ele que ajudava as pessoas na travessia do rio quando estava cheio, e quando estava seco ficava sentado nas barrancas pitando seu velho cachimbo de barro; eu mesmo já vi ele: depois da chuvarada de 1952, sua vó Dalila já velhinha ficou muito doente, uma febre forte que não tinha remédio que desse jeito; deixei Siloé seu pai aqui tomando conta dela, e fui buscador Rufino rezador lá pras bandas do Caldeirão; o dia tava escurecendo, e o rio transbordava água por todos os cantos de sua margem; a única forma de atravessar era de canoa que de cá de longe agente via se balançado nas águas do rio; vi que a velha canoa não estava vazia, tinha uma pessoa dentro dela e eu pensei que fosse Rogaciano o barqueiro que tinha ficado no lugar do pai quando morreu. O traje era o mesmo, mas a voz era do “velho do Rio” que me perguntou:” “__tá indo buscar o rezadô? Mió nun ir.”
“__já era começo de noite e eu senti meu corpo se arrepiar, percebi que a canoa não ia nem pra frente nem pra traz, também, tinha ficado amarrada na Gameleira que nunca saiu dali da margem do Rio. Cortei a corda e chegamos na outra margem; como de costume dei uma moeda de dois tostões ao barqueiro, que onde estava ficou envolto em sua capa, e eu não pude ver o seu rosto. Fiz a minha viagem, e voltei só no amanhecer do dia junto com Rufino rezador. Devido a chuva ter parado, o rio tinha baixado um pouco suas águas, mas não dava pra gente atravessar a nado; vi que a canoa estava amarrada do outro lado se balançando com o movimentando da correnteza; então comecei a gritar chamando pelo barqueiro que parecia não me ouvir; gritei, gritei, gritei e nada do barqueiro aparecer.
De cá de onde eu estava vi nossa casa com um fio de fumaça na chaminé; pensei comigo vou gritar mais alto quem sabe assim alguém possa me ouvir. Foi daí que Siloé seu pai me ouviu, saiu porta a fora, e de cá vi o desespero dele pra chegar na barranca do rio; percebi então que não tinha barqueiro e Siloé veio nos buscar. A noticia não foi boa; “__pai, mãe Dalila morreu logo depois que o senhor saiu, e Rogaciano tá muito doente, nós estamos sem barqueiro.” Bem que eu podia ter ouvido o barqueiro; não adiantou nada eu ter ido buscar o rezador. Dalila morreu, ficamos sabendo que foi febre tifo; naquele mesmo dia depois do enterro eu fui até a canoa para desvendar o mistério; os dois tostões que eu tinha dado ao barqueiro estava lá no lastro da velha canoa. É, o “Velho do Rio” estava sempre ali, nas águas barrentas do Rio Gavião.