Pecado

Contava assim meu avo, em noites estreladas sentado em um tronco de aroeira a luz de lamparina no quintal.

Aquele pequeno objeto com óleo e um pavio ficavam escondido do vento para não apagar, sua luz era vagarosa e parecia mais uma penumbra na noite.

Que há muito tempo atrás vivia em uma casinha de sapê no pé de serra uma família.

Isidoro era um homem descrente em sua casa só ele falava e todos respondiam sem perguntas ou decisões, um lenhador que entrava na floresta com seu carro de boi e o carregava de lenha para levar aos povoados da região , seus quatro bois eram enormes com chifres que pareciam tocar as nuvens.

Sua mulher Senhorinha era pequena e franzina, mas era devota de uma santa na qual rezava todos os dias suas orações e o pequeno menino com o nome de Francisco.

Isidoro era barbudo não usava nada nos pés sua aparência assustadora, e a quilômetros se ouvia o carro de boi cantar nas estradas daquele serrado, e quando seus enormes bois empacavam eram cutucados com um enorme ferrão,e Isidoro blasfemava e evocava nomes como “desgraça” e o que lhe passava pela cabeça, seus xingamentos duravam horas ate que os bois tirassem o carro lotado de troncos do lugar.

Francisco com oito anos já fazia algumas tarefas, como dar agua a uma mula e outros quatro bois novos que estavam sendo treinados para puxar o carro de boi, e sempre ao meio tarde sua mãe ajoelhava no pequeno altar feito de um caixote de madeira e o chamava.

- Francisco venha vamos rezar.

O menino que estava sempre com um sorriso chegava correndo e pulando como se trocasse os passos no ar, ficava correndo perto da mãe e acompanha sua mãe na ave Maria.

- Mãe já rezei, já vou brincar.

E sua mãe continuava a rezar por mais um tempo, tinha que acabar antes que Isidoro chegasse, pois para ele aquilo era perda de tempo, ficar ajoelhado rezando para uma imagem.

Um dia Isidoro chegou mais cedo da mata e perguntou a Francisco como estavam os bois, o menino correu para perto do carro de disse:

- Pai estão prontos para trabalhar.

Isidoro os colocou no carro, ainda não estavam prontos, pois eram novos e um menino os treinou, os bois não sabiam o que fazer.

Isidoro começou a suas blasfeme-as, Francisco correu para dentro da casa e ficou ao lado de sua mãe,

Foram horas que Isidoro cutucando os bois com seu ferrão e os soltou novamente, entrou na casa furioso e começou a bater em Francisco, Senhorinha não aguentou ao ver o pequeno apanhar e entrou na frente e ajoelhou implorou para Isidoro parar.

Senhorinha deitou sobre o menino que estava caído no chão e pegou nos braços e o levou para o quarto, Isidoro pegou sua aguardente e saiu da casa e lá passou a noite bebendo.

Os anos foram passando Francisco cresceu, já com doze anos era um menino forte e os bois que ele treinara já estavam prontos para ser usado no trabalho.

Isidoro sempre saia na escuridão da madrugada para a floresta, e Francisco acordou achou estranho, pois sua mãe acordava muito cedo, mas saiu para fazer suas tarefas no quintal e ficou horas ocupado, foi quando olhou para a casa e a pequena janela que sempre estava aberta estava fechada, Francisco entrou e foi ate o quarto sua mãe ainda estava na cama.

- mãe acorda, acorda mãe. E a tocou ate que ela abriu os olhos, Senhorinha estava doente e muito fraca, sua vos era sussurrada, Francisco foi para a cozinha e preparou um chá, mas a mulher só molhou a boca não tinha força.

Francisco que sempre acompanhou os afazeres de sua mãe começou a fazer a comida, Isidoro chegava para comer em poucas horas, em uma vasilha de barro Francisco coloca a comida e tentava fazer sua mãe comer foram dias sem obter uma melhora.

Isidoro chegava à porta do quarto olhava a mulher adoentada na cama e saia de casa com sua garrafa de aguardente.

Francisco já não ficava mais em seu quarto, dormia no chão perto da sua mãe, em uma manha viu que sua mãe estava gelada e por mais que tentasse acordar era sem êxito, saiu seu pai já estava pronto para ir para a floresta.

- pai a mãe não acorda.

Isidoro entrou no quarto olhou a mulher, chegou perto da cama e agachou e colocou a mão no rosto dela e disse:

- Sua mãe morreu.

Sem muito que falar saiu e foi para fora da casa.

Francisco chegou perto da cama e começou a acariciar o rosto da mãe e suas lagrimas começaram a rolar pelo rosto.

Algum tempo depois Isidoro entrou novamente na casa e pegou senhorinha nos braços e a levou para o carro de boi, colocou-a na madeira dura do assoalho e disse ao menino.

- Fique ai vou levar ela no povoado para enterrar.

Francisco ainda com lágrimas no rosto correu para dar o ultimo abraço na sua mãe.

Aquele dia Francisco ficou o dia todo sentado em um tronco que ficava em um do lado da casa e Isidoro só chegou do povoado escurecendo deitado no carro bêbado.

No dia seguinte Isidoro levantou e foi a cozinha e em cima do fogão de lenha ficava a carne seca, retirou um pedaço e colocou no bornal e em pote pegou um pouco de farinha e saiu, Francisco viu mas não podia fazer perguntas só observou.

Isidoro não veio para o almoço e só chegou anoitecendo com o carro lotado de lenha, assim repetiu se dias,

O menino não mais cozinhava para o almoço e o que fazia no jantar às vezes nem era consumido, pois seu pai bebia muito e ia dormir.

Ate que um dia Isidoro saiu para mais um dia de trabalho muito cedo, a floresta estava com muito nevoeiro que não se via os bois à frente do carro, já era pouco mais do meio dia quando Francisco ouviu o cantado do carro, Isidoro estava voltando o menino ficou no quintal esperando seu pai entrar para ajuda-lo, mas Isidoro voltou sem lenha, estava com arranhões pelo rosto e nos braços, estava tremulo e seus olhos estavam parados, desceu do carro e sentou-se na soleira da porta, o menino retirou os bois do carro e os soltou, mas os quatro enormes bois não saíram do lugar e ali ficaram em pé e nada os faziam se mexer.

Isidoro sentado com os olhos fixos para o chão, já estava quase escurecendo quando ele levantou e entrou para dentro da casa e em um pequeno lençol colocou alguns pertences e saiu novamente, foi ate a mula, o animal não queria que ele chegasse perto e por muito insistir conseguiu passar uma corda no seu pescoço e monta-la, a mula mansa resistia aos comandos da corda e o queria derrubar.

Isidoro saiu no passo a passo pela estrada com o animal que relinchava, parecia estar desviando de alguma coisa que estava ao seu lado.

Francisco foi para a cozinha fez o jantar e ficou esperando seu pai, já era tarde a porta ainda aberta e Francisco dormia no pequeno banco de troncos na cozinha. Assustado acordou e olhou para o quarto e seu pai não estava, foi lá fora e não viu ninguém fechou a porta e foi dormir, acordou cedo saiu para o quintal os bois ainda estavam no mesmo lugar como se estivessem presos ao chão, tentou tocar e os ferroava e nada não se mexiam.

Francisco ficou pensando que seu pai iria voltar, foram dias mas Isidoro nunca mais voltou, a comida estava acabando o menino precisava tomar uma decisão, os bois ainda estavam parados no mesmo lugar magros e um deles morrera ali mesmo, Francisco resolvera colocar os bois que ele tinha treinado no carro precisava levar lenha no povoado e pegar alimentos para não morrer de fome.

E assim Francisco começou a fazer o que seu pai fazia, e os anos foram passando Francisco estava barbudo e quando seus animais empacavam também blasfemava e evocava todos os diabos que lhe passava pela cabeça. Um dia Francisco voltava do povoado em uma estrada, o sol estava muito quente ele avistou em sua frente em uma sombra de uma arvore seca que um raio tinha destruído uma senhora maltrapilha com uma pequena trouxa, e quando se aproximou seus bois começaram empacar não queriam passar pela senhora, mas Francisco com o ferrão cutucava um e outro boi ate que eles quase no barranco do outro lado passaram. A mulher olhou para Francisco de disse:

- Moço o sol esta muito quente, pode me dar uma carona ate mais a frente.

Francisco em pé na frente no carro de boi parou esperou que a mulher subisse no carro, quando a mulher colocou sua trouxa no assoalho do carro a madeira seca estalou e ringiu , Francisco olhou para a mulher que estava subindo no carro e disse:

- Sua trouxa parece pesada senhora?

A mulher já em cima do carro responde: - E um pouco moço, e o pecado do mundo eu tenho que carrega-la para onde vou.

Francisco chacoalha as rédeas dos bois para que eles andem, as correntes se esticam e o carro fica parado, Francisco cutuca com o ferrão, os cascos dos bois escorregam no chão e muito peso, Francisco, enche de ar o peito para começar a gritar e blasfemar e a senhora interrompe e fala.

- moço não precisa me chamar eu estou aqui.

Ouve se o barulho dos joelhos de Francisco bater na madeira dura do assoalho, Francisco junta as mãos uma na outra e começa e rezar a única coisa que aprendeu com sua mãe quando era criança, uma Ave Maria, seu corpo estava tremulo e só abriu os olhos quando sentiu o balanço do carro, já estava a quilômetros daquele lugar, seu pai não teve a mesma chance não sabia rezar uma Ave Maria.

Meu avo acabava essa historia assim.

- vamos todos para dentro rezar um Ave Maria antes de dormir.