A Surra.

Nos anos 50 conheci um dentista prático, era uma profissão muito praticada no interior de Minas Gerais, isto é, profissional que não formou-se em universidade, com certeza em um curso técnico. Esse profissional dos dentes, com uns 30 anos mais ou menos, boa aparência, esmerado no vestir, sempre perfumado, deixava as mulheres alvoraçadas. O dentista era considerado pelas mulheres o homem mais bonito do Vilarejo. Apesar de ser casado com a mulher mais bonita do lugar, era um mulherengo incorrigível . Acho que seria como se diz nos dias de hoje, viciado em sexo, foi visto debaixo de uma árvore a beira de um ribeirão, transando com uma mulher mais feia do que briga de foice no escuro.

Diziam que além de bonito tinha o diabo nos olhos, mães aconselhavam as filhas não encara-lo. Os mais letrados do Vilarejo diziam que o dentista tinha magnetismo nos olhos. Ele atrapalhou casamentos e noivados. Com facilidade para conquista e seu insaciável desejo por sexo, as mulheres não lhe davam trégua . Diziam que a mulher de um rico comerciante local, manteve encontros com ele em cidades da região. Também diziam que em seu consultório, ele chegou a transar com algumas de suas clientes. Chegou ser descoberto em uma família de grande poder econômico e político, mas abafaram-no , o que seria o maior escândalo, principalmente por tratar-se de família tradicional e de conceituada moral religiosa.

Mas como diz o ditado popular; “um dia é da caça, outro do caçador”. Num belo dia ele bateu de frente com a caça, os olhos magnéticos dele falharam , bolinou uma bela morena casadinha de novo, ela levantou-se da cadeira e foi chorando para casa. O marido era de uma família de gente muito brava. O marido da jovem senhora foi até ao consultório, o chamou num particular dizendo que pensou em mata-lo, mas como devia muitos préstimos ao seu pai, optou por dá-lo uma surra num momento oportuno.

Todos no Vilarejo ficaram sabendo da cruel promessa. Tinha os contras e os a favor da tal surra. Quando Antério vinha da fazenda para o povoado, alguém dava-lhe dica onde estava o dentista. Quando o dentista estava em um lugar estratégico, alguém o advertia de que Antério estava no Vilarejo. Assim era como a caça do gato e o rato.

Passados seis meses, todos já tinham esquecidos e o próprio dentista acreditava que Antério ofendido em sua honra, tinha abrandado a raiva, foi aí que aconteceu. Em uma noite chuvosa, ruas cheia de barro, estava o dentista num bar jogando sinuca, Antério e um irmão apareceram de supetão , armados até os dentes, jogaram o dentista na rua e perguntaram-no: “ você quer morrer ou apanhar até cagá”? O dentista respondeu: “ apanhar até cagá.” Bateram-lhe tanto que chegou a desmaiar. Parecia mais um porco coberto de lama. Sua calça de linho branco e sua camisa de seda, ficaram irreconhecível.

Dias depois com a visita do pai, disse-lhe: “ papai, estou aliviado!” O pai quis saber porquê,? Ele disse quase com ar de vitória: "Tomei a surra!..."

O nome Antério é fictício.

Os nossos erros nos escraviza para uma vida pior.

Rui Barbosa.

Lair Estanislau Alves.