OUTRA CONVERSA DE COMPADRE
OUTRA CONVERSA DE COMPADRES
Lá pelas bandas de Curralinho, quando se reunia os homens em volta de uma fogueira tosca, preparada pelas mãos de algum criado doméstico, resquício vivo da longínqua escravidão, muito embora os atuais fossem amarelos, brancos, bobos, negro aço ao alpino. Não importa qual o grupo "preconceituado", mas estavam ali presentes marcando corretamente os passos miscigenação.
Conversa vai, conversa vem, nunca vi turma tão boa de jogar conversa fora como aquela, e quando não tinha nenhuma conversa nova, voltavam a repetir a conversa de ontem, de anteontem, sobre o lobisomem, a mula-sem-cabeça, Rosinha macho-fêmea, os encesto de Buzico, ou qualquer bobagem dessas que rondam os vilarejos e cidadelas do interior.
Um dos compadres lembra:
- Vocês já comeram maçã da macieira do Balduino?... Sempre a gozação aparecia vez por outra...
Todos olharam para o falante da vez, nem se fez preciso mas aquela interrogação só teve uma coletiva resposta uníssona :
- N Ã O! . . .
- Pois é... (continuou o falante ) já faz mais de uma geração que ele encomendou uma muda macieira lá das bandas da Argentina, plantou, aguou tudo em todos os dias de meu Deus, sempre na mesma hora com água fria, mais nada, nunca ninguém viu as frutas, cadê as MAÇÃS ?...( HÁ DE CONVIR QUE NAQUELA ÉPOCA ESSA FRUTA ERA "DIFICULTOSA" EM SER ENCONTRADA POR LÁ, quando achava era das grandes bem vermelhas, cheirosas, importadas e que algum gastador inveterado comprou na capital .
- É e alguém já viu a macieira do Balduino?...
- Sim eu já vi...
- Eu Também...
- eu, eu e eu...
Todos ali já haviam visto pelo menos uma vez, aquela árvore desajeitada, cheia de galhos secos, secos e arrebitados, retos, aprumados para o céu, como se estivesse em permanente prece, orando para que Deus lhe desse alguma fruta, nem que fose uma "veizinha" só.
Balduino não incomodava se fosse mesmo por milagre... Mas sempre nada, nem passarinho assenta naquela árvore.
- É acho que a gente devia por um nome na maçã dessa macieira...
- Qual é o nome compadre?
O compadre tira o chapéu, alisa os poucos cabelos brancos, pensa, repensa, dá uma baforada no fedorento cigarro de palha e lembra do capetinha que o Coronel João Caldas tinha guardado em uma garrafa dentro do cofre.
- "Cêis lembra" do capetinha do João Caldas, não tem capetinha não, lá dentro tem é um "Saci-Pererê, com gorro vermelho da mesma cor de maçã, cachimbo na boca torta, eu já vi, o coronel me mostrou, eu falo que o capetinha é um saci, juro...
Todos os presentes também juram de pés juntos que também já viram, mas que na realidade ninguém viu e lasca:
- "MAÇÃ SACI"... A gente sabe que existe mais nuca vê...
Como não podia deixar de ser, todos riram, o fogo da fogueira apagou-se, encerrando mais uma boa conversa fiada do dia...
Goiânia, 16/11/13.