A SURRA E O JUIZ DE PAZ

JUIZ DE PAZ E A SURRA

VÍRGULA: 7

ONOFRE JOSÉ DE LIMA, itaberino , tinha três irmãos e três irmãs, portanto a família de Lima, tronqueava-se em três casais, sobrando um como o sétimo membro. Não havia nenhum destaque notório em sua família, sendo todos de origem muito simples e comuns, convivendo todos, no inicio da vida com os afazeres que lhes eram incumbidos, ou que o destino lhes reservara. Adoniana, Ana, Alasca, Antonio, João, Artur e Onofre, na juventude seguiram cada qual para o seu rumo, havendo dai para frente uma convivência cada vez mais frágil, primando todos por certa frieza sentimental. O único que não desfrutava desta frieza era João que havia morrido em um dos primeiro acidentes automobilísticos do estado.

O Sr. Onofre José de Lima, chamado com a incumbência de resolver, certa vez, no cargo de Juiz de Paz, a um litígio envolvendo Manoel Eva, que vivia com duas mulheres e o Delegado Cabo Jesuíno, achava imoral essa convivência. Iniciada audiência propõe:

- De acordo com a mais alta autoridade policial deste município, acusando seu Manoel Eva, de atentado moral à lei e a ordem pública, determino que a partir de agora não poderão viver mais sobre o mesmo teto, de acordo com entrevista que tive com as duas mulheres, cada uma vai viver em uma casa diferente, mas o senhor fica definitivamente proibido de encontra-las juntas, agora se quiser viver com uma durante o dia e a outra durante a noite, a lei não tem nada a se opor. Sentença sabia.

Não temos nada que nos indique quem foi, mas que pelo menos foi para ajeitar a vida de um amigo, que além de ser o cambista de bicho mais querido da cidade, único açougueiro e fornecedor de marmitas, cuja saborosa comida fazia parte da casa do Sr. Onofre José de Lima. Era comum altera-la com a da Dona Das Dores, afim de vê-la descansar em seus apoquentamentos, ou melhor, preserva-la no quarto nos momentos comuns de histerismo. Tirando os altos e baixos que o comportamento de sua esposa lhe empunha.

Ele tinha uma vida calma, até tempo de fazer viagens a cavalo ou tirar alguns piaus das corredeiras cristalinas dos riachos. Como não tinha nada para ela reclamar ou cobrar alguma satisfação, agora lhe cobrava uma falta do passado.

- Onofre, você sabe bem que o meu nome, Das Dores da Silva de Lima, não está certo, desde o nosso casamento lá em Nazário.

-Sei não.

- Pois é eu lembro bem o padre falou que nos tínhamos de registrar o casamento no Cartório Civil, onde meu nome passaria a ser Das Dores da Silva de Lima, como já consta na Certidão de Nascimento de nossas filhas, mas legalmente e como costa no meu Título de Eleitor, estou ainda com o nome de solteira.

-Tudo bem, quando o Juiz de Direito vier na próxima temporada Forense, eu vou consertar seu nome.

- Não sei porque veio uma coisa na minha cabeça, Onofre, nós levamos nove anos para ter a Gema, quando ela nasceu, veio toda pretinha, começou a clarear depois do segundo dia. Naquela época eu morria de amores por ela, bem como agora meu amor é grande por ela, eu tenho as outras, gosto muito delas; não sei se é por que ela nasceu muito frágil, se foi pela expectativa de tanto tempo querendo um bebê. Depois a Gema teve aquele desmaio inexplicável aos quatro anos. Até hoje morro de medo de acontecer-lhe qualquer coisa.

-Não é só com ela, é com os outros também. Eu sei, eu sei, mas com ela o cuidado e o medo são muitos maiores. Falar nela, onde será que ela está?

-Foi buscar a marmita, combinei com a mulher do Mané Eva, para mais uma nova temporada.

-É bom mesmo, porque preciso descansar...Com qual das mulheres ele trabalha? A do dia ou a da noite?

-Não entendi o porque?

-Enjoou da minha comida ? Ou está assanhado para o lado das mulheres? Indagou-lhe.

-Não é nada não, é que ele me contratou para ferrar mais uma tropa, o negócio de alugar cavalos dele está indo muito bem. Assim eu já desconto a marmita no serviço.

Conhecendo o ciúme doentio de Dona Das Dores, desconversou.

Ao ser vista na rua Gema, percebeu que a Eliana, filha da Rosarinha, antiga Diretora do Grupo a acompanhava de longe, ao dobrar a esquina notara que ela havia sumido, quando aproxima do açougue viu que ela vinha vindo com a Maria Ordalia e mais duas filhas do Zé Pedro; ao chegar para buscar a comida, sentou se próxima da cozinha, onde várias mulheres elaboram deliciosa refeição, justamente naquele momento em passam os últimos bifes de fígado acebolado. O cheiro gostoso exala por todos os lados, excitando o apetite de quem os sentisse. A filha do Mané, uma moreninha gorducha a chama.

- Gema, vá até lá fora que tem alguém querendo falar com você.

-Tudo bem, só vou avisar ao seu pai que estou lá fora e já vou. Quando chegou na porta, foi cercada por um bando de meninas comandadas por Eliana; a Maria Ordalia a intercepta:

-Essa atrevida nem cumprimenta a gente, só anda de nariz arrebitado.

-Nariz arrebitado e muito metida, falou outra.

- Metida diz saber tudo e cola, atrevida, arrematava outra.

-Além do mais, toma o namorado da gente, salpicou outra.

-Depois então que foi paraninfa da turma, e discursou para o Governador é que ficou metida mesma. Toma vagabunda. Aplica-lhe Eliana uma rasteira, derrubando-a no meio das outras, que ao verem-na caída no chão, aproveitaram e cada uma delas agrediu com puderam, com as mãos, com os pés, cuspindo.

- Apanha vagabunda, gritava desesperadamente Maria Ordalia. Sendo interrompidas com a chegada de seu Mané, avisado que fora do acontecido por sua filha.

- Parem, parem, o que é isso, ficaram malucas. Parem suas pestinhas. Acuadas pelo homem correm todas, deixando a pequena vítima ensangüentada no chão. Socorrida pelo cambista empresário, amparando a pequena indefesa, toda machucada, coloca-a em seus braços e a leva para a casa dos seus pais.

Ao ver sua filha chegando nos braços do amigo, entra em choque outra vez.

- Chamem o Doutor Dione urgente, chamem-no, minha filha esta morta.

Como sempre foi medicada pelo paciente médico, verdadeiro anjo encarnado, anjo a serviço daquela família, anjo guardião de toda a cidade, atendendo a todos indistintamente, se tinham dinheiro atendia, se não tinham atendia da mesma forma, ainda dava amostra grátis aos mais carentes. Ao terminar os curativos vendo que ela já recupera os sentidos, perguntou-lhe:

-O que foi minha pobre pequena?

-Inveja Doutor, só inveja. Foi a resposta que recebeu.

Goiânia, 05 de agosto de 2009.

jurinha caldas
Enviado por jurinha caldas em 04/11/2013
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