Ditinho e o Tigre
Entre as varias redações que escrevi, creio que naquele dia eu me superei... Claro que sem a ajuda de uma pessoa muito especial para mim, nem saberia por onde começar.
Aquele mês as aulas de português tinham sido intensas, eu ainda não conseguia me expressar direito, eu escrevia e depois quando ia ler quase que não entendia a história...
Era uma sexta feira. Foi uma grande surpresa para todos quando ela escreveu no quadro negro o titulo. O Tigre. O Que sei eu desse bicho!
Com muito rigor ela soletrou:
- Quero essa lição pronta na segunda feira! Vale nota 5! Entenderam?
Alguns tiveram algumas pequenas duvidas e ela as tirou, as minhas eram muitas e a vergonha não me deixou levantar a mão...
Aquele dia cheguei à minha casa preocupado, nota 5, é tudo que eu preciso para passar!
Peguei uma folha e escrevi. O tigre. E dai pra frente não me surgiu mais nenhuma ideia.
A porta rangeu. Era Imácula, ajudava mamãe nos afazer do lar. Ela era descendente de escravos, eles viviam ali na região desde 1650... Ela percebeu meu olhar preocupado e me perguntou.
- O que foi Ditinho... Tá doente, tá quieto demais sô?
Então sem alternativa contei pra ela sobre a lição, afinal ela contava umas histórias que nem os olhos piscam. E eu disse também que nem imaginava o que escrever sobre um Tigre.
Ela fechou os olhos por alguns segundos, abriu-os, puxou uma cadeira, sentou-se a meu lado, deu um longo suspiro e contou:
- Sabe Ditinho, quando eu era menina, já tinha ouvido falar, mas nunca havia imaginado que um Tigre era um gato bem grande. O pai, do pai, do pai, do meu pai já contava uma história de Tigre que eu jamais esquecerei, era assim...
Eram chamados de Tigres aqueles os pobres escravos que na calada da noite, carregavam os excrementos de seus senhores que os armazenavam durante o dia em barris. E pela madruga eram transportados por negros que as iam despejar em fossos ou no mar. Esses negros eram chamados “Tigres”. Mais tarde esse nome também passou para o barril. Foram humilhados ao limite da desconsideração humana, se sujeitavam aos caprichos dos inescrupulosos e poderosos. Para se chegar a Tigre meu filho, ainda precisa ter a sorte de não ser um dos nove milhões que não suportaram a travessia, vitima de alguma doença ou simplesmente lançado ao mar. Nos negros somos humanos, descendemos dos Tigres, porém com um passado marcante e sofrido, não merecemos desculpas nem promessas, fomos trazidos a essa terra maravilhosa para trabalhar, e é só isso que queremos, pois com trabalho seremos com certeza, respeitados. Pois há um Tigre dentro de cada um de nós. É isso que sei sobre Tigre.
- Bom gente, não vou nem dizer minha nota, adivinhem!
- A professora chamou o grupo todinho e me fez ler a minha redação...
- Fui aplaudido de Pé...
- Imácula, Deus te ilumine, governe, Amém.
Entre as varias redações que escrevi, creio que naquele dia eu me superei... Claro que sem a ajuda de uma pessoa muito especial para mim, nem saberia por onde começar.
Aquele mês as aulas de português tinham sido intensas, eu ainda não conseguia me expressar direito, eu escrevia e depois quando ia ler quase que não entendia a história...
Era uma sexta feira. Foi uma grande surpresa para todos quando ela escreveu no quadro negro o titulo. O Tigre. O Que sei eu desse bicho!
Com muito rigor ela soletrou:
- Quero essa lição pronta na segunda feira! Vale nota 5! Entenderam?
Alguns tiveram algumas pequenas duvidas e ela as tirou, as minhas eram muitas e a vergonha não me deixou levantar a mão...
Aquele dia cheguei à minha casa preocupado, nota 5, é tudo que eu preciso para passar!
Peguei uma folha e escrevi. O tigre. E dai pra frente não me surgiu mais nenhuma ideia.
A porta rangeu. Era Imácula, ajudava mamãe nos afazer do lar. Ela era descendente de escravos, eles viviam ali na região desde 1650... Ela percebeu meu olhar preocupado e me perguntou.
- O que foi Ditinho... Tá doente, tá quieto demais sô?
Então sem alternativa contei pra ela sobre a lição, afinal ela contava umas histórias que nem os olhos piscam. E eu disse também que nem imaginava o que escrever sobre um Tigre.
Ela fechou os olhos por alguns segundos, abriu-os, puxou uma cadeira, sentou-se a meu lado, deu um longo suspiro e contou:
- Sabe Ditinho, quando eu era menina, já tinha ouvido falar, mas nunca havia imaginado que um Tigre era um gato bem grande. O pai, do pai, do pai, do meu pai já contava uma história de Tigre que eu jamais esquecerei, era assim...
Eram chamados de Tigres aqueles os pobres escravos que na calada da noite, carregavam os excrementos de seus senhores que os armazenavam durante o dia em barris. E pela madruga eram transportados por negros que as iam despejar em fossos ou no mar. Esses negros eram chamados “Tigres”. Mais tarde esse nome também passou para o barril. Foram humilhados ao limite da desconsideração humana, se sujeitavam aos caprichos dos inescrupulosos e poderosos. Para se chegar a Tigre meu filho, ainda precisa ter a sorte de não ser um dos nove milhões que não suportaram a travessia, vitima de alguma doença ou simplesmente lançado ao mar. Nos negros somos humanos, descendemos dos Tigres, porém com um passado marcante e sofrido, não merecemos desculpas nem promessas, fomos trazidos a essa terra maravilhosa para trabalhar, e é só isso que queremos, pois com trabalho seremos com certeza, respeitados. Pois há um Tigre dentro de cada um de nós. É isso que sei sobre Tigre.
- Bom gente, não vou nem dizer minha nota, adivinhem!
- A professora chamou o grupo todinho e me fez ler a minha redação...
- Fui aplaudido de Pé...
- Imácula, Deus te ilumine, governe, Amém.