A PICADA ABANDONADA

 
      Antes de começar quero explicar para quem não sabe o que é uma picada. Antigamente na zona rural havia muito mato, as fazendas tinham grandes extensões cobertas por mata fechada e também não tinha tantas estradas como hoje.
      Para facilitar a comunicação de uma fazenda para outra, porque às vezes pela estrada dava-se uma volta muito longa, abriam-se picada na mata, era uma trilha aberta a foice cortando a cipóeira, a vegetação pequena desviando das árvores grandes, abria-se um caminho para passar a pé ou a cavalo apenas.
    Morava na fazenda Gervazio, um caboclo solteiro de uns vinte e cinco anos, trabalhava na lavoura de café junto com sua família. Num dia de festa na vila dia do padroeiro depois da missa, numa grande barraca cercada de bambu rachado e coberta de lona, ao lado da igreja havia quermesse com muita comida, leitoas, frangos assados, pastéis e outras iguarias e também diversas qualidades de bebidas.
    Tinha também uma barraca de música onde um rapaz sentado atrás de uma mezinha controlava o som. Uma vitrola e diversos discos de cantores e estilos variados, a pessoa pagava um pequeno valor para escolher uma música e oferecer a alguém que ele anunciava no sistema de alto falante.
    Gervazio estava do lado de fora da barraca, quando recebeu da mão de uma criança um correio elegante dizendo que alguém gostaria de conhecê-lo, ele rapidamente procurou uma das meninas que vendia os tais correios elegantes e comprou um. Pegando emprestado uma caneta, rabiscou uma resposta com alguma dificuldade pela falta de hábito de escrever, marcando um encontro, o local seria ao lado esquerdo da barraca do som junto a um poste da iluminação.
    Feito isso entregou para criança o bilhete e foi para o local esperar, passado uns dez minutos ele teve até um frio na barriga, aproxima-se dele uma linda mulata de porte esguio, cabelos cacheados pelos ombros e um lindo sorriso com dentes muito brancos, Gervazio nem acreditava era Sofia que ele já conhecia de vista e morava na fazenda vizinha.
   Ficaram passeando na pracinha em frente a igreja conversando, quando já estava na hora de irem embora ele a pediu em namoro, ela disse que aceitava mas que ele tinha que ir no próximo sábado na sua casa pedir para seu pai, e assim ficou combinado.
    Tinha um problema para ir a fazenda vizinha pela estrada era muito longe, pois tinha que passar pela vila, o único atalho era uma picada que atravessava o mato que era na divisa das duas fazendas, mas ela estava abandonada, todos diziam que era mal assombrada e ninguém passava por ali há muito tempo, o mato quase tomara conta da picada novamente, restava apenas o sinal dela.
  Gervazio chamou uns colegas para ajudá-lo a abrir a picada novamente, de início não gostaram muito da idéia ficaram com medo, mas foram e fizeram o serviço.
    No sábado Gervazio foi a tardezinha para a fazenda vizinha, chegou à casa da moça quase escurecendo conversou com o velho, como este já o conhecia sabia que era moço direito e trabalhador aprovou o namoro.
    Ficou conversando com a família e quando se deu conta já passava da meia noite, lembrou-se da picada sentiu até um arrepio, mas não podia mostrar fraqueza e pedir para pousar logo no primeiro dia o que iriam pensar dele e Sofia perderia o interesse, onde já viu um medroso.
    Pensando assim despediu-se de todos e pegou o caminho. Não era muito longe coisa de uns cinco quilômetros passava por uma lavoura de café, de mato mesmo não tinha mais que dois quilômetros.
    O moço foi entrando no mato, era um grotão e no fundo corria um córregozinho que tinha uma pinguela para atravessar, quando ele foi se aproximando da baixada sentiu um frio estranho más achou que era devido á água, passado a pinguela escutou passos de alguém andando de botas, ele parou olhou para trás, não viu nada, voltou a andar, ouviu novamente os passos, parou outras vezes e olhou, nada, deve ser impressão pensou, continuou andando.
    Mas não era imaginação ele ouvia nitidamente alguém o seguindo sentiu um arrepio, mas o que fazer agora correr não adiantaria, então tomou coragem parou meio de lado na picada e disse, olha aqui se quer vir comigo passa na frente eu não quero ninguém andando atrás de mim, ouviu os passos passarem para frente e seguir pela picada até sair do mato.
    Gervazio chegou a sua casa ainda tremendo, no outro dia separou uns porcos que tinha, durante a semana os vendeu e com o dinheiro comprou um cavalo e passou a ir a casa da namorada pela estrada, não contou a ninguém o acontecido, mas nunca mais passou pela picada.
João Batista Stabile
Enviado por João Batista Stabile em 14/08/2013
Reeditado em 20/08/2015
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