DE BARQUINHO...


(Continuação de SALIM ABOU ADIB EL RAFIR, de Alberto Vasconcelos)

Salim estava cansado de Murucututu Açu. A cidade pequena, monótona, deixava-o enfadado, sem a possibilidade de ver seu negócio ir para frente. Era aquele velho marasmo, um freguês comprando uma roupinha aqui, outro um brinquedinho ali, nunca chegando a causar reboliço na sua banca de últimas novidades, como ele mesmo dizia, ao término da jornada diária.
Alguns mascates itinerantes, sempre se referiam a São Paulo, as cidades vizinhas, como a região do ABC paulista, formada, principalmente, por Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul. Ali o comércio era forte, tornando-se um atraente negócio.
Então, Salim vivia sonhando em vir tentar a sorte aqui pelo sudeste, na esperança de se tornar um cidadão de respeito, comerciante de boa envergadura, próspero. Escolheu Santo André, que lhe pareceu ser o lugar mais apropriado para realização de seus sonhos.
Assim determinado, juntou toda a sua mercadoria, despachando-a via
transportadora. Antes, porém, pesquisou qual a melhor localização para montar sua “loginia”, escolhendo os arredores da estação da estrada de ferro. Lugar muito movimentado, tanto de intenso trânsito de veículos, como de pessoas. Santo André, após o movimento sindicalista iniciado em 1978, que culminou com a fuga da maioria de suas indústrias, tornou-se uma cidade dormitório, com grande parte da população indo trabalhar em outros centros, principalmente em São Paulo. E, a melhor condução para levá-la até lá, era o trem.
Logo que iniciou as atividades, Salim viu que sua escolha fora acertada. A “Novidades do Salim”, como foi chamada a loja, vendia bem, roupas íntimas de mulher, moda feminina, sandálias, bijuteria, e afins. Salim, na porta, feliz da vida, falava:
- Vamo entrarr mocinia, tudo baratinio. Baga em treiz veiz!
Apesar da concorrência, os vizinhos logo se simpatizaram com o Salim, devido a sua simplicidade. Todos os dias, uma vez pela manhã, outra de tarde, pelo menos, alguns deles iam tomar um cafezinho no bar ao lado, e Salim passou a fazer parte do grupo. Nas conversas, sempre diziam:
- Cuidado, Salim, você precisa se preparar para o período de chuva!
Precisa colocar comporta na entrada da loja, para evitar que a água entre!
- Non brecisa! Num tem berigo!
Dito e feito. Em Santo André, são constantes as inundações causadas pelas chuvas, e a região da estrada de ferro é uma das mais castigadas. Ficando na parte baixa da cidade, e não tendo outro escoadouro que não o Rio Tamanduateí, quando este enche, causa o refluxo das águas pluviais, ocasionando as enchentes, com invasão em lojas, moradias, e outros estabelecimentos. Nas ruas, os veículos são arrastados, e vão de encontro aos postes, muros, outros veículos, e as lojas são invadidas por água barrenta, que com a força, levam tudo para o verdadeiro rio que se forma no local.
Não ouvindo o conselho dos vizinhos, Salim viu todo o seu estoque ir por “água abaixo”, pouca coisa se salvando.
Que fazer? Não esmoreceu!
Após, feito o rescaldo, decidiu apostar novamente na “Novidades do Salim”, tendo, porém, tomado as precauções necessárias para evitar que o acontecido se repetisse.
Hoje, Salim é um dos homens mais ricos da cidade!
 
Aristeu Fatal
Enviado por Aristeu Fatal em 02/08/2013
Reeditado em 12/10/2013
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