O ESTRANHO DO 143
O que é o nada para alguém que havia perdido tudo?
Paulo chegou estranho naquele dia. Fazia tempo que ele não sorria como antes e cada vez mais parecia entristecido.
Cumprimentou o porteiro como sempre fazia, entrou no elevador a apertou o 14º andar. Num impulso segurou a porta, para que a moça do 96 entrasse e como cavalheiro, apertou o botão se seu andar.
Chegou em casa como sempre fazia, eram 18:25 e ele tomou seu banho. Preparou seu prato preferido (costelas de porco ao molho inglês), abriu uma garrafa de vinho e encheu sua taça. Caminhou até sua vitrola, abriu a tampa e certificou-se de que o seu LP preferido estava lá. Colocou a agulha no álbum e logo o chiado do vinil misturou-se aos primeiros acordes do lado B do Closer.
Voltou para a cozinha. Fez seu prato, sentou-se e comeu, enquanto tomava seu vinho.
Ao fim da refeição, pegou um bloco de post-it e escreveu nomes de diversos amigos, foi colocando em cada coisa sua, do tapete de entrada ao último lençol.
Paulo estava decido partir dessa vida e assim o faria, não sem antes preparar um plano para se vingar daqueles que o deixaram assim.
Ligou o gás, foi para a cozinha, aumentou o volume da vitrola (e já era 21:30, as 22:00 deveria desligar) e deu um tiro na própria boca.
Caiu inerte no exato momento em que soava o último acorde da última música do último lado do último álbum gravado por Ian Curtis. O estrondo então pode ser ouvido.
Curiosos, alguns vizinhos se juntaram para descobrir de onde havia vindo tal barulho e notaram que apenas Paulo, o estranho do 143 não estava lá.
Subiram aos apartamentos e pela porta ouviram o barulho da agulha batendo no disco, nem repararam no cheiro de gás. Ligaram para o síndico, duas horas depois tinham percebidos que havia algo errado e arrombaram a porta.
O choque da visão foi horrível, Paulo estava caído em cima do sofá, alguém resolve acender a luz e... Bum!
No dia seguinte estava manchete no jornal: “Explosão mata 07 moradores da cidade de Piiskatchin” e ninguém cita Paulo, ninguém cita a arma e nada é comentado.
O prédio foi interditado e mais uma vez Paulo foi ignorado.