Os três batismos de Zé do norte.
-Então Zílio, como foi o casamento do seu irmão? Perguntou Zé do norte ao garoto Zílio que o conduzia até as escadarias da catedral da sé.
-Quase não aconteceu seu Zé, se sabe que meus pais são evangélicos e nenhum de nó é batizado e o padre cismou que meu irmão tinha de ser batizado antes do casamento.
-Ah, e oque ele fez?
-Foi batizado, oras!
-E seus pais?
-Ficaram uma fera é claro, mais fazer oque? Os pais da noiva eram italianos e católicos fervorosos, aquilo ia virar uma guerra santa.
Imagine a cena de meu irmão, um marmanjo daqueles sendo batizado.
Morreu de vergonha, mais depois o padre fez o casamento.
E o senhor seu Zé, É batizado?
-Eu? Claro, fui três vezes batizado, Responde Zé enquanto já afinava a viola.
-Ué, e pode? Perguntou Zílio sem entender nada.
-Bem, se pode eu não sei. Mais foi assim que aconteceu.
-Ah, seu Zé então conta.
O Zé então fez como sempre fazia antes de contar um causo, tirou o chapéu, olhou para o céu e fez uma reverencia como sempre fazia.
Bem meu primeiro batizado se deu a poucos dias de eu nascer e foi assim.
Meu pai homem das antigas e bruto, muito ignorante e broco não admitia que minha mãe lhe levasse a boia fria.
A dele tinha de estar sempre quente, se não... bem cê sabe, o coro comia.
Então minha mãe fazia a comida e saia correndo pra levar para ele antes que esfriasse.
Mais certo dia havia passado a noite toda chovendo muito, deixando todo o terreno envolta da casa num brejo só.
E lá se foi minha mãe, com a marmita em uma das mãos e eu nos braços do outro lado.
Ela corria muito e com toda aquela lama não tardou a escorregar, e lá se foram à marmita para um lado e eu para outro. Caí dentro de uma poça de água.
Minha mãe pensando na surra recolheu a marmita e correu para levar ao meu pai.
Fiquei um bom tempo ali com a cabeça sobre a poça de água, foi meu primeiro batismo.
Fui batizado pela mãe natureza e tive como padrinhos os animais da mata.
Quando minha mãe voltou eu estava bem quentinho no meio dos estrumes de vaca e das folhas das árvores que caíram sobre mim.
Quando fiz um ano meu pai descobriu que eu era cego, culpou a minha mãe por esse infortúnio.
E disse que para evitar que eu tivesse uma existência miserável e cheia sofrimentos por causa da cegueira, o melhor era ser caridoso e tirar-me a vida, livrando-me assim de um futuro de sofrimento e dor, e assim fez.
Amarrou-me a uma pedra e jogou no rio.
(Foi meu segundo batismo.).
Fui batizado nas águas tendo como padrinhos os peixes dos rios.
Não sei se por milagre ou porque meu pai não soubesse dar nó me soltei das cordas e boiei até a margem onde uma mulher lavava roupa.
Ela mulher muito religiosa ergueu-me para o céu, agradeceu seus seu santo de devoção e caridosa como era levou-me para casa e me apresentou a seu marido dando-me o nome de Moisés.
Mais não demorou muita para perceberem minha deficiência e resolverem que o melhor para mim seria entregue-me ao padre santo e assim quem sabe ser curado da cegueira.
O dia de me entregarem foi o domingo de batismo.
E enquanto todos estavam dentro da igreja festejando os batizados meus salvadores me colocaram dentro de uma cestinha e deixaram do lado de fora da porta da igreja.
Ah, mais justo naquele momento começou a chover. e enquanto o padre fazia o batizado lá dentro ,Deus com sua chuva fazia meu batizado cá fora .
(Foi meu terceiro batismo.)
Tive como padrinhos os pássaros do céu que cantavam na cobertura da igreja e os cachorros que me aqueciam enquanto se escondiam da chuva.
-E depois seu Zé, o padre te batizou?
-Não, o padre santo disse que seria pecado batizar um enjeitado como eu. Disse o Zé rindo.
Mal sabia ele que eu já tinha sido batizado três vezes, e que o próprio Deus tinha feito o batismo.