A chuva de sapos
Aconteceu num domingo, quando todos estavam sesteando depois do almoço. O tempo nublou e se ouviam trovões ao longe, mas ainda estavam distantes e a chuva que viria era convidativa para um sono mais prolongado, de modo que as pessoas continuaram deitadas e tiveram que puxar cobertores porque esfriou de repente.
A chuva começou fraca, sem vento, lambuzando as janelas e depois veio forte, contínua. Uma benção que caía sobre a terra. Alguns dormiam, outros namoravam, outros se preparavam para levantar e fazer o chimarrão. E todos se assustaram quando um barulho forte e intermitente ameaçou com uma chuva de pedras. Acabou com a plantação, diziam todos.
A chuva durou pouco, mas o suficiente para encher as ruas de sapos e pererecas e ninguém conseguiu sair de dentro de suas casas sem pisar em algum desses bichos. Caíam mortos pelos telhados, entupiram muitos canos e realmente acabaram com a plantação.
Por onde se via, era um tapete de sapos de todos os tamanhos e cores e não havia lugar onde não tinha um pulando ou coachando. Ninguém sabia o que fazer, mas tinham que fazer alguma coisa rapidamente antes de sair o sol, que acabou saindo logo em seguida para desespero da cidade.
Algumas mulheres começaram a varrer a entrada de suas casas e os homens subiram nos telhados para limpá-los e consertar as telhas quebradas pelo impacto da chuva que ninguém sabia ao certo se tinha sido realmente de pedras ou de sapos. Logo, não havia mais lugar para amontoar tanto bicho e muitos deles saltavam de volta ao lugar de onde tinham sido varridos e se escondiam debaixo das casas e dentro de valetas e vasos já sem flores.
As vassouras logo ficaram empapadas de visco e tinham que ser trocadas por pás ou ancinhos, que nesse caso prejudicavam ainda mais a situação que já estava deveras horrorosa. A coisa já estava muito complicada quando nos lugares escolhidos para o despejo não cabia mais nenhum sapo. Houve um rumor alto de vizinho para vizinho e a notícia que se soube e que valeria a pena tentar era um enterro em massa.
Foi o que fizeram.
Começaram por enterrar os mortos em grandes fileiras a céu aberto, e conforme os bichos caíam lá dentro, uma grande turba ia fechando e batendo com os pés para que a terra ficasse firme.
Todas as hortas e plantações receberam em seu seio aquela quantidade imensa de sapos e pererecas e em muitos lugares a geografia foi alterada de campo para pequenos morros, como se pode constatar hoje, depois de 90 anos passados, onde fica uma prolífica plantação.
Para os sapos vivos adotaram a técnica do “passa fora” deixando o serviço para as crianças que estavam se divertindo. Muitos batráquios pularam no rio e nunca mais foram vistos, outros foram morrendo aos poucos aqui e ali, mas a situação já estava controlada.
Por muito tempo a população festejou aquele dia como um feriado, pois que era a luta de todo um povo contra uma intempérie um tanto quanto fora do comum.
Depois de alguns anos, os festejos foram cancelados. E essa história foi contada de pai para filho como numa procissão de vida.
Os campos sempre férteis da Campina da Cascavel são uma prova viva e viscosa desse causo e é uma pena que ninguém se lembre do ocorrido.