O CASO DO CORONEL CIUMENTO E DE SUA ESPOSA QUE ERA UM VERDADEIRO AVIÃO

Coronel Joca Pereira era homem poderoso e temido, mas padecia de uma fraqueza muito comum em quem ama sem ter certeza de ser amado: o ciúme. O maldito ciúme lhe corroía as entranhas, lhe atormentava a alma. E Coronel Joca Pereira tinha motivos para ser assim tão ciumento: Sua mulher era um verdadeiro monumento. Era daqueles espécimes que exalam sensualidade. Guilhermina era mulher para homem nenhum botar defeito; bonita indo e vindo. Quando ia mostrava uma retaguarda pomposa, arredondada e com dimensões perfeitas; e quando vinha a comissão de frente parecia uma dupla de turbinas dispostas em exata simetria enfeitando aquele avião de mulher. Um verdadeiro parque de diversão equipado com tudo que é brinquedo que homem gosta.

Rico, fazendeiro de soja, já lá pelos setenta anos, viúvo, o Coronel conheceu Guilhermina numa pensão de mulher dama. E depois que experimentou o xibio da rapariga ficou enfeitiçado. Todo o dia ia ao lupanar para que a moça lhe prestasse serviço. Ficou tão a gosto que resolveu conversar com a cafetina e levar a moça para a sua casa.

Na casa grande, Guilhermina pousava importante, como se fosse patroa. Nariz empinado, dava ordens a torta e a direito, tratava mal os empregados e não lhes tinha nenhuma consideração.

Quando ia para a cidade se empetecava toda. Parecia que ia a uma festa de gala. Salto alto, meia fina, óculos importado, perfume francês. No começo o coronel não ligava, mas com o passar do tempo começou a ficar desconfiado. A mode do que aquele luxo todo, se perguntava. Carecia se enfeitar tanto e colocar lingerie novo para ir ao doutor?

Depois de uns tempos, Guilhermina se tornou mais assídua nas visitas ao médico da cidade. Coronel Joca ficava pensando se ela estaria com alguma doença grave e não queria lhe contar?

Ou será que estaria lhe colocando chapéu de touro, enfeitando a testa? Não queria nem pensar nisso. O sangue fervia só de imaginar. Mandaria capar o miserável que se atrevesse a tocar em Guilhermina.

O tempo passou e o coronel foi ficando cada vez mais desconfiado. E aquela velha história do “quem procura acha” acabou acontecendo. Certo dia, no meio dos cosméticos de sua mulher, o coronel achou um bilhete do Dr. Sezinando marcando encontro com Guilhermina na quinta-feira, quatro da tarde, em seu consultório. O sangue subiu e o coronel quase teve um infarto. Então as suas desconfianças tinham razão de ser. Guilhermina estava metida em sem-vergonhice com o tal do doutorzinho.

Coçou a testa e sentiu que tinha uma protuberância. Maldição! Será que já lhe estavam nascendo os cornos?

O doutorzinho ia ver o que era bom para a tosse. Ia ficar sem bago e depois sem vida ou ele não se chamava João Pereira, vulgo Joca Pereira, filho de Tibúrcio Pereira e Helena Ferreira Alves, ambos de saudosa memória. Ninguém deveria se atrever com Guilhermina, mulher do coronel, sem saber que corria risco de vida.

Mandou chamar Salustiano, jagunço perigoso, cabra macho e de confiança, responsável por várias covas rasas em cemitérios da região, para lhe passar as ordens. Deveria eliminar o doutor Sezinando.

- Vai lá e apaga aquele desgraçado. Corta os bagos e a estrovenga, enfia na garganta e depois faz o serviço. Olha, muito cuidado. Não quero testemunha. Depois me avisa quando tiver acabado.

O safado ia pagar caro pela petulância. Guilhermina continuaria sendo mulher de apenas um homem: e esse homem, só poderia ser ele, naturalmente.

Salustiano preparou a arma, um 38 reluzente, e saiu satisfeito para cumprir a empreitada. Essa seria muito fácil. Aquele merdinha de médico não era de nada. Um almofadinha, um borra bosta que só sabia receitar dois remédios: da barriga para cima Cataflan e da barriga para baixo Buscopan. Estava com os colhões a prêmio.

O coronel esperava ansioso pela notícia do jagunço. Só ficaria satisfeito quando o doutorzinho tivesse trocado o terno de gabardine por outro... de madeira.

À noitinha, Salustiano orgulhoso de seu serviço, foi dar satisfação para o patrão.

- Coronel, o vivente estrebuchou. Não é mais vivente.

- Boa notícia... bom serviço. Sem testemunhas, é claro, né Salustiano?

- Certeza Coronel, sem testemunhas. Tinha uma loira bonita com ele. Foi visitar Jesus também. Dois tirinhos no meio da testa. Ninguém mais viu não, coronel.

Eita desgraça! Jagunço bom esse tal se Salustiano.