Segredo na ponta dos dedos!
Tudo aconteceu num vilarejo bem próximo do Rio Manso. Ali vivia um rapaz robusto, de olhar negro, sobrancelhas grossas e sem falhas. Ele pertencia a uma família muito tradicional desse povoado chamado Várzea Bonita. Esse rapaz era muito bem quisto por todos da região. Falante, de roupas grosseiras e sem muita vaidade ele fazia um trajeto longo todos os finais de semana para o distrito mais próximo chamado Alto dos Vinhedos.
Ali, religiosamente acontecia uma feira em uma das ruas da cidade e os fazendeiros e suas digníssimas esposas frequentavam essa feira, afim de algumas barganhas e também de apreciar tudo o que de novo eles encontravam nessa feira. O jovem por sua vez levava um bornal cheio de pedras azuis, esverdeadas e amarelas, todas pontiagudas que ele mesmo recolhia no famoso Rio Manso. Um certo dia, um fazendeiro de grandes posses, de bigode sobre os lábios e chapéu bem curado, sem perceber esbarrou naquele jovem que estava encostado em uma marquise.
O fazendeiro olhou mais que depressa e pediu desculpas ao jovem, e curioso com o olhar fixo do jovem foi indagando-o, querendo saber mais da vida dele.
Você pertence à família dos Sobreiros não é?
_ Sim, respondeu o jovem.
O fazendeiro não satisfeito e incomodado pelo olhar fixo do jovem continuou a explorá-lo.
Olha rapaz, se não me falha a memória, seus pais prestaram-me alguns serviços no ano de 1942 no cultivo das uvas, e nesse mesmo ano sua mãe dera à luz a um menino no meio dos ramos secos de uvas onde ela ajudava seu pai. Tenho forte convicção de que esse menino é você. Seu pai não é o Antônio de Paula Sobreiro?
_ Sim, respondeu o jovem.
E sua mãe não é a dona Quitéria Júlia Alves Sobreiro? É sim, senhor!
E o olhar fixo do jovem para um ponto somente simplesmente tirava o sossego do fazendeiro que logo perguntou.
O que você traz nesse bornal rapaz?
_ Algumas pedras que recolho no Rio Manso, senhor. São lindas, porém creio que sem nenhum valor aparente, mas as maiores servem como ótima decoração.
E quais você tem aí?
_ Hoje eu trouxe as amarelas, algumas azuis e duas esverdeadas de tamanhos maiores, senhor.
O fazendeiro, vendo a simplicidade daquele jovem, propôs ao jovem uma barganha.
Olha rapaz, lá nas minhas terras eu tenho muitos gados, alguns cavalos e muitas cabras e eu estou com um cavalo de um ano e meio chamado Segredo e quero te presentear com ele em troca das suas pedras. Você aceita?
O rapaz mais que depressa aceitou. O fazendeiro quis aprofundar mais na vida daquele jovem e disse:
_ Olha, te achei muito sincero e seu olhar fixo me chamou a atenção.
O jovem sem esperar mais perguntas respondeu:
_ É que eu não enxergo, senhor!
E como você sabe então as cores dessas pedras?
_ Olha, senhor, eu perdi a minha visão aos sete anos de idade, e já nessa época eu colecionava centenas delas, portanto aprendi a ler com as pontas dos dedos tateando apenas. Na verdade eu não enxergo, mas eu sinto.
O fazendeiro comovido com o depoimento do rapaz lhe perguntou:
E qual o segredo para isso?
O jovem sem hesitar respondeu:
_ Olha, senhor, segredo geralmente não se conta. Toma aqui as suas pedras e me traz logo o Segredo que eu quero enxergá-lo e descobrir qual a cor predominante dele!
E o Segredo, aos nove anos de idade, fizera daquele jovem "sem visão", um dos maiores campeões de equitação, reconhecido e premiado na sua região e ele nunca deixou de recolher as suas tão coloridas pedras!