AS TARDES DA MINHA INFÂNCIA

Atualmente eu recordo com saudade os momentos marcantes vivenciados na minha infância. Ao encerrar as chuvas de outono, finalizando as colheitas entrando no período mais frio, chegavam as belas tardes juninas ao por do sol com um céu infinitamente muito azul e límpido o amarelo boreal do ocaso banhava de ouro a franja do infinito acima da linha do horizonte com o seu colorido encantador tornando-o num do mais belo espetáculo da natureza. Com os bandos de pássaros de várias plumagens e cores deixando os banhados em busca de seus dormitórios nas capoeiras que cobriam os montes.

Os meninos nossos vizinhos, meus primos e eu. Abríamos as duas Porteiras que se confrontavam no curral à frente de nossa casa, fazendo delas os gols, improvisando o nosso campo de futebol. Nas noites enluaradas as partidas que não tinham tempo determinado estendiam até esbarrar nos chamados de nossas mães para recolhemos. Bola de meia, velha recheada de panos ou até mesmo as enormes laranjas de fazer doce que eram amaciadas com nossos pés descalços até se esbagaçarem, sendo usadas várias em cada partida esfolando nossos dedos e pés, quando estavam ainda verdes.

O cheiro do esterco do curral misturado ao sumo das saborosas mexerica muito abundante em nosso quintal e que ficava impregnado em nosso corpo exigindo uma constante vigilância de minha mãe recomendando-me um banho caprichado com a bucha de palha de milho e o tradicional sabão preto feito de dicoada.

Em noites de escuridão muita brincadeira diferente acontecia às vezes até mesmo o futebol aproveitando a claridade na queima da palha de feijão cuja cinza era usada para os barrileiros de onde se extraia a dicoada com a qual se fabricava o sabão preto.

Quantas tardes saudosas povoam minha lembrança. Quando o sol mergulhava no horizonte e o infinito bordava a imensidão cósmica por milhões de estrelas, caia o silencio da noite. Ao cessar, o vento cedia seu espaço para a brisa que sutilmente começava a carregar os murmúrios do cotidiano rural, como a bulha das vacas nas canas de milho da distante palhada além do rio Picão, e o perfume das flores silvestres, que a natureza adormecida em sua tranqüilidade nos oferecia.

Nós meninos de dez anos ou pouco mais, de cócoras com os queixos atolados nos joelhos apreciando a solidão do universo, vez por outra salgando a língua com a ponta do indicador suja pela sobra do sal babado pelo gado no cocho do curral, aonde sentados nele, procurávamos as constelações de estrelas como o cruzeiro do sul, sete estrelas e outras tantas que a matéria escolar indicava-nos em nosso aprendizado. Ouvindo as pancadas do monjolo, e o despencar da água na bica, o cantar dos grilos, dos curiangos, e os gritos de urutaus nos distantes cerrados. Apreciando uma ou outra estrela cadente, que por ventura surgisse riscando o universo com seu rastro de magia; o desfile dos vaga-lumes que deixavam seus esconderijos e sobrevoavam as residências atraídas pela luz das lamparinas que escapava pelas frestas dos telhados.

Agora na reta final de minha caminhada, tomado pelo imenso saudosismo que me domina fico imaginando aquelas senas tão bela, e procurando encontrar onde havia maior beleza; se no brilho das estrelas que povoavam a solidão universal daquele cenário tão real, ou na pureza de nossas almas adolescentes, que aos poucos foram tomando consciência da vida. Cada um de nós a buscar nossa verdadeira realidade identificada socialmente com o nosso dever de cidadania. Seguimos dispersados como folhas secas ao vento, desgarradas daquela nossa magia de sonhos que vivenciamos em nossa saudosa infância. Marcando o primeiro capitulo de nossa história.

Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 18/03/2013
Reeditado em 18/03/2013
Código do texto: T4194671
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