A ARMA ENFERRUJADA

Por josafá bonfim

Logo que chegamos, estavam na fila de atendimento do DETRAN, apenas quatro veículos. Ao posicionarmos no quinto lugar, alguém veio em correria pedindo que recuássemos para o sexto lugar, vez que o quinto o pertencia. E apontou para o seu veiculo que se encontrava bastante recuado quase fora do nosso campo de visão. Acatamos, e ao retrocedermos para nos encaixar no lugar que seguramente seria nosso, um outro veiculo conduzido por uma jovem, chega de rompante e tenta tomar a nossa frente. Meu filho, que conduzia o nosso automovel, não quis ceder a vaga por achar que estava daquela feita, sendo logrado. No que estava com razão. Ponderei, e pedi que mais uma vez ele recuasse cedendo o lugar, para assim evitar desentendimento. Ele não relutou. Mas não houve tempo de atender o novo pedido que lhe fiz, pois, de repente surgiu não sei de que “sepultura”, um enfurecido brutamontes que aos brados e dirigindo impropérios, alegou que o nosso automóvel estaria tentando usurpar a vaga da fila que seria do veiculo de sua namorada.

Criou-se o impasse. Eu tentava fazê-lo me ouvir, e entender que a situação estava sanada e que não havia motivo para tamanha descompostura. Mas o moço, que nunca tínhamos visto antes, parecia possesso, continuou proferindo impropérios, com o dedo em riste no rosto do meu filho que nem chance tivera de sair de dentro do veiculo, que por sua vez já se encontrava na posição inferior a vaga questionada.

Antevendo o iminente ataque covarde que meu filho de 18 anos estava prestes a sofrer, me antecipei, e do alto de minhas limitações físicas, tentei amenizar a situação e de todas as formas acalmar a ira do estranho, momento em que este se virou furioso para mim e de maneira ameaçadora se aproximou de tal forma que tive de dar três passos rápidos para trás, quase caindo. Era o último recurso...

Não sei se o agressor captou o meu gesto, ou foi mesmo a intervenção Suprema que o fez recuar e em seguida se afastar do local, sem deixar de dirigir palavras ofensivas ao vento. Respirei fundo, contei até dez e agradeci ao meu Deus pelo desfecho final daquele imbróglio, apesar de tudo aquilo.

Lá mais à frente, quando terminamos de ser atendidos no pronto serviço ao veículo, percebi que o grandalhão ainda se encontrava por ali. E de onde estava, me fitava constantemente. Mas dessa feita me parecia com o aspecto sereno de pessoa normal. Voltei mais uma vez o olhar para a sua direção, quando este fez um gesto ameno indicando que desejava trocar um diálogo comigo. Recomposto os nervos, concordei de pronto. Ele se aproximou e de forma agora cortez me estendeu a mão e apresentou uma série de pedidos de desculpas pela atitude vil que cometera. Parecia outra pessoa. Disse já ter conversado calmamente com a namorada e sabido desta, que na verdade nós é quem estávamos com a razão por termos chegado primeiro a malfadada fila, e não ela, no carro do casal.

Aceitei as escusas, selamos a paz e fiz com que meu filho ainda ressentido também assim procedesse.

Pude enfim me identificar ao rapaz, tecer algumas considerações e melhor saber ao seu respeito. Disse-me ser usuário de medicação controlada e que esta ministrada junto à substâncias anabolizantes que também fazia uso, o tava levando a certo desequilíbrio emocional momentâneo.

Filho de empresário de destaque na cidade, ao se despedir, me deu o seu contato, abraçou-me forte, e até percebi que o rapaz suava frio. Colocou os serviços do conglomerado da família à minha disposição e retirou-se.

Do meu turno, cabisbaixo, dirigi-me ao meu veículo e percebi que minhas carnes ainda tremiam. Passei a mão na testa suorenta, atirei-me no banco do carona e enquanto nos deslocávamos ao convívio do doce lar, como um filme, vi correr em minha mente diversas lembranças de situações embaraçosas e arriscadas que tive de enfrentar nos meus trinta anos de exercício profissional de quem agora me recolho ao descanso. Só então me dei conta do leve incomodo na minha linha de cintura. Era a velha companheira de oficio profissional que a União me assegura. Pude enfim me livrar da ferramenta de trabalho, voltá-la de novo para o seu retiro debaixo do banco, e agradecer mais uma vez ao ser Supremo, por não ter havido necessidade de usá-la.

São Luis/MA, 17 de janeiro de 2013

josafá bonfim
Enviado por josafá bonfim em 17/01/2013
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