O motorista de ônibus
Decorridos uns 20 anos aproximadamente. Evolui na carreira profissional, fiz meus progressos na escala hierárquica de uma grande empresa e enfim, um cargo de diretor comercial que eu estava exercendo já há uns 5 ou 6 anos.
De repente, o vigia da portaria liga e pede pra falar comigo. Estava preocupado porque estava lá fora uma pessoa muito nervosa, um senhor já dos seus 40 anos querendo falar com o gerente de vendas e reclamava em alto e bom som do representante da empresa que havia feito pouco caso no atendimento porque ele era um iniciante, um cliente pequeno e portanto deveria comprar nos distribuidores e não diretamente na fábrica.
Com esse perfil, eu resolvi atendê-lo, pois precisava ouvir seus proprios argumentos já que conhecia o perfil do representante que realmente era meio pedante e não se dava mesmo ao trabalho de dar atenção a esses pequenos negócios.
Quando o sujeito aponta na porta da minha sala, pelo vidro, eu vi sua fisionomia falando com a secretária e percebi que o conhecia de algum lugar perdido no tempo. Simplesmente naquela fração de segundos, fiz um esforço e não consegui identificar quem poderia ser com uma fisionomia tão forte e tão presente nas minhas lembranças do passado.
Ele entrou, riu e foi preciso: Eu não acredito que você é aquele garoto desajeitado que vivia correndo atraz do meu onibus e eu sempre te dando colher de chá parando fora do ponto, pra voce não perder o horário de seu trabalho - E acrescentou: - É você mesmo?
Eu imediatamente o reconheci e nos abraçamos etc, pois realmente naquele tempo, a gente tinha uma vida bem melhor, conhecia os policiais da rua, os famosos "Cosme e damião" que sempre andavam juntos e ao tomar os onibus, a gente sabia o nome dos motoristas e eventualmente eles também nos tratava pelo nome. Que bons tempos, mesmo sendo numa capital como Belo Horizonte que na epoca dos bondinhos deveria ter ai, seus 300 mil habitantes.
Depois desse susto agradável proporcionado pelo tunel do tempo, eu lhe perguntei:
- Mas o que o amigo faz aqui, numa fabrica de tecidos? E querendo brigar com o gerente de vendas, e que já sei, não vai haver mais briga?
Ele então, em tom mais sério e profissional, perguntou-me se eu não poderia abrir uma excessão e vender-lhe apenas 300 ms de brim pra confecção de bermudas, pois ele estava começando o seu negócio e não queria comprar de atravessadores, pois era mais caro e o nosso representante lhe esnobou (palavras dele) e não queria vender.
Eu disse:
-Peque a cartela de cores e peça o que voce quiser, na quantidade que voce quiser e não vai haver favor algum. Jamais negamos a um cliente, seja de que tamanho for, o direito de nos comprar diretamente, desde que comprove estar estabelecido legalmente.
Ele disse sorrindo:
-Eu tinha quase certeza, uma espécie de pressentimento, que eu seria muito bem recebido aqui e tive a sorte de encontrar um amigo de muitos anos.
E quando saiu, pediu-me uma coisa que eu não titubiei em atende-lo com o poder que eu tinha:
-Por favor, eu não quero que esse representante receba um tostão de comissão pelo pouco caso que fez de mim. Pode ser?
Eu disse:
Fique tranquilo, ele será punido com essa restrição e será advertido verbalmente por esse procedimento.
Dez anos depois, esse mesmo cliente continuava comprando diretamente da fabrica e atingiu a quantidade média de 10.000 metros por mes e o represente ia lá, pediu-lhe desculpas, mas ele não perdoou.
Para que voces tenham uma idéia, se esse representante não tivesse feito pouco caso desse iniciante, ele estaria recebendo uma comissão de aproximadamente R$2.000,00 mensalmente, somente sobre as faturas desse cliente. Ele perdeu, ou deixou de ganhar aproximadamente durante uns 3 anos um valor aproximado de 72.000 mil reais, sem considerar valores menores de quando iniciou as compras diretas. E considerando que algum advogado ou estudante de advocacia possa estar lendo isto aqui, informo que o contrato permitia esse tipo de interferencia, além da clausula que nos permitir nomear quantos vendedores quizessemos, desde que para atender uma demanda comprovadamente não trabalhada.
Por isso, gosto de contar essas pequenas passagens da minha vida, mesmo que vindas de experiencias profissionais, em que a gente recebe pequenas lições de vida das quais com um minimo de inteligência você absorve e norteia seu próprio estilo e comportamento e constrói seus códigos de ética.
Minha mãe sempre dizia e me alertava:
"Nada melhor que um dia depois do outro".
Obsv. importante: Peço aos meus leitores e/ou eventualmente outros visitantes que não me conheçam que, ao lerem meus textos por favor desconsiderem as eventuais falhas na acentuação das palavras, erros de concordância verbal e nominal, pois eu não construo meus textos previamente (pelo menos a maioria). Eu simplesmente, chego, abro a minha escrivaninha e disparo de improviso minhas histórias, estórias e meus protestos. Abraços e obrigado.