VOZ amiga

E ele a ouviu...

Depois de tanto tempo sem conseguir ouvir aquela voz amiga, que sempre o direcionava, ele pode novamente ouvi-la e reconhecê-la.

Parou.

Fez Silêncio.

E pode sentir o grito chegar quase sem força em sua garganta... abafado.

O grito estava sendo sufocado durante todo esse tempo. Estava sendo ignorado devido a tantos acontecimentos em sua vida que o fizeram criar inconscientemente e de uma forma um tanto involuntária manter uma certa resistência, uma barreira que o impedia de ir a fundo em tudo. Ele estava pela primeira vez vivenciando a vida que tanto temeu viver. Uma vida superficial. Ele estava vivendo a sua vida ao avesso. Já não se reconhecia diante do seu próprio reflexo. E a sua imagem sempre lhe parecia turva. Se perdia aos poucos e aos poucos observava sua essência ser despejada gradativamente, escorrendo por debaixo da fresta da porta.

Estava em inércia.

Sentia-se perdido e por diversas vezes se via pegando atalhos em busca da felicidade mais próxima, a mais barata. Se via perdido no meio do caminho sem saber se deveria seguir ou voltar dali mesmo. Sua mente, sua vida, seu peito estava em confusão e ele não podia demonstrar fraqueza. Não onde não tivesse ninguém para o compreender e o ajudar. Não onde a felicidade e o astral do ambiente parecia depender dele e somente dele. Não podia expor suas feridas, pq só ele sabia tratar delas, só ele tinha a cura. Mas a essa altura, nem ele mesmo sabia se tinha.

Por vezes se viu sem saber por qual caminho ir e resolveu parar de seguir. Sentiu os pés acorrentados por desejos incertos e vontades reprimidas. Correntes de insegurança passavam por todo o seu corpo. O prendia naquela situação, da qual um dia manteve sempre uma distância segura. Mas como foi parar ali? Como conseguiu chegar naquele estado? Eram perguntas que nem ele mesmo sabia as respostas e sempre que tentava entender, parecia ser tomado por uma incompreensão inexplicável. Estava faltando direção, um senso de direção que ele costumava ter. Sua intuição parara de falar ao peito, foi calada assim, num ato de crueldade e agressão à alma. E agora, aonde se encontrava aquele garoto seguro de si e de coração branco? Por onde seguia? O que fizeram com ele? O que fizeram com as folhas em branco que ele sempre tinha por preencher? Ele sempre dizia que estava em busca do momento certo, da tinta que condizia com sua essência. Um dia chegou chorando, desesperado por terem derrubado suas folhas em uma poça d'água suja. Todo o branco foi tomado por uma cor, resultante do marrom mestiçado ao preto e... fedia. Alguém havia tomado de suas mãos e jogado ao vento sua história, sua vida. E as folhas caiam enquanto as lágrimas escondiam os seus olhos castanho escuro. E em segundos, eu vi fugir dos seus olhos o brilho que costumava me encantar.

E agora ele temia...

Um medo de tudo e de todos o fez se resguardar, se omitir, se esconder. Fez retirar do peito tudo que tinha e colocar em uma caixa trancada as sete chaves. Por medo ele começou a andar olhando para os lados receoso e seus passos passaram a ser desprovidos da firmeza que os seguia. Aos poucos já nem falava consigo mesmo. Sua voz amiga havia se calado de vez, o deixado desnorteado e só. E ele começou a andar por conta própria, fazendo o que bem lhe parecia correto.

E todas as noites sentia saudades de quem era...

Saudades!

Um dia acordou bem no meio da madrugada e sentiu algo quente invadir seus olhos e tatear o seu rosto. E sentiu aquele aperto no peito se esvair.

Parou.

E...

Fez silêncio.

Sentiu a resistência abalar. Ouviu ao pé do ouvido a voz amiga sussurrar, dizer que estava ali, novamente, para ajudar. A voz amiga tinha voltado e dessa vez pra ficar. Pq ele aprendeu que não devia se calar para dar voz aos outros. Aprendeu que devia ouvir mas que também precisaria ser ouvido. Entendeu que deveria ouvir aos outros mas também compreendeu que precisaria se ouvir mais, se quisesse sobreviver.

Reges Medeiros
Enviado por Reges Medeiros em 29/11/2012
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