A MORTE DOS PEIXES

A MORTE DOS PEIXES

"Seu João" Quebra Queixo tinha ido caçar tatus há dois dias na Serra dos Picos e lá o cachorro Tubarão acuou um tatu na entrada da toca."Seu João na pressa de chegar ao local,para não perder a caça,estrepou-se num espinho de juazeiro. No momento nada sentiu pois estava com o sangue quente. Conseguiu pegar o tatu antes que ele entrasse no buraco. Depois ainda conseguiu pegar outras caças, quatro jacus que estavam empoleirados num pé de aroeira, cinco juritis numa arapuca que havia feito durante o dia. Bem, é bom que se diga que a caçada estava sendo feita à noite. Fora ele tinha ido o Zé Miguel, seu compadre, e os cachorros Tubarão e Faísca. A caçada Não tinha sido das melhores, devido a estrepada de "Seu João" no espinho. Com meia hora, quando já estavam voltando, o dedão começou a doer. Espinho de

juazeiro é bicho malvado, não tem pena de cristão."Seu João" notou que tinha ficado uma ponta de espinho no dedão do pé e ao chegar numa clareira, já morrendo de dor puxou a faca de ponta da bainha e com a ajuda do clarão da lua enfiou a faca no dedão, trincou os dentes e sem um pio arrancou o espinho. Doeu, mas não deu um gemido. Cabra macho não grunhe, dizia ele. Chegou em casa. repartiu a caça com o compadre, foi depenar as aves e depois dormir.

No dia seguinte, o dedão começou a inchar e a doer, mas nem ligou. Depois a dor aumentou e então ele chamou dona Hemengarda, sua mulher e mandou que passasse álcool. Ela disse que ia doer e ele no seu machismo, resmungou:

- Faça o que eu estou mandando mulher.

O álcool penetrou no furo, mas ele fez que não sentiu. Mandou que esquentasse a ponta da faca e passasse em cima do furo. A carne chiou de queimada, mas ele ficou impassível. Bom, o certo é que o tratamento não surtiu efeito e lá pras sete horas da noite "Seu João" já estava com 39 graus de febre. O ferimento já estava infeccionado. Mandou que colocasse uma pasta de mastruz e foi dormir.

Mas não pregou os olhos e levantou-se às 4 horas da manhã com uma febre de 41 graus. Enrolou-se com o cobertor e foi sentar-se no pilão da cozinha e chamou a mulher para lhe fazer um chá de capim santo e o café, porque já estava passando da hora. Dona Hemengarda reclamou, dizendo que aquilo não era hora de se acordar. "Seu João" ficou furioso e iniciou-se uma discussão de casal. Então, com raiva, saiu de casa. Tanto pela discussão como pela força da febre, começou a correr pela estrada afora. Entrou na Lagoa do Juá saindo do lado oposto. Ao chegar do outro lado a febre tinha passado, mas ele olhou para trás e viu o rastro de peixes mortos pela quentura do calor da febre. O povo da vizinhança, que já estava acordado, caiu pra cima dos peixes e já na quebrada da barra começou a recolhê-lo.

"Seu João" contava a estória no mercado publico da cidade e mais

uma vez o Zé Capote estava ouvindo com várias outras pessoas. Então disse:

- "Seu João", mas por que os peixes só morreram por onde o senhor passou?

"Seu João" deu um salto felino de onça suçuarana e sentou a mão entre a tábua do queixo e o pé do ouvido do Zé Capote. Desta vez ninguém pôde evitar. Zé Capote caiu estatelado duro no chão, com o maxilar deslocado e o pé do ouvido sangrando. Passaram álcool em seu nariz e levaram-no para o dr. Mingueira, a fim de recolocar o queixo. Enquanto isto, "Seu João" dizia:

-Eu bem disse que te pegava Zé Capote e hoje chegou o teu dia. E quem "tiver" achado ruim pode cair dentro.

Mas, quem era louco para enfrentar uma onça daquela. Todos se calaram e procuraram acalmá-lo.

"Seu" João jura que o fato se passou em 1940, em plena Segunda Guerra Mundial.

Conto dedicado ao poeta\escritor cearense FRANCISCO MESQUITA, que gosta muito e é conterrâneo de Itapipoca-Ce.

Antonio Tavares de Lima
Enviado por Antonio Tavares de Lima em 03/10/2012
Reeditado em 09/04/2014
Código do texto: T3914233
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