RESPONSABILIDADE COM A PRÓPRIA VIDA

Neuza Maria Spínola

Quando Lorena se mudou do interior para Belo Horizonte sua meta era fazer faculdade, e acompanhada por seu pai foi a uma república em que viviam 8 moças, que alguém havia lhe indicado, e lá passou a morar. Sua meta era fazer a faculdade, em cujo vestibular se aprovara, e trabalhar para complementar a ajuda que seu pai lhe daria.

Uma de suas colegas, cujo namorado era italiano e casado, passou a olhar para Lorena com olhares estranhos, e este estava acostumado a ser o conquistador por quem as moças suspiravam. O cara era picareta, contador de vantagem, bonitão, e Júlia, sua colega, era apaixonada por ele.

Não havia uma oportunidade em que ele, mesmo na frente de Júlia, não tentasse conquistar Lorena, que reagia sempre contra as suas investidas.

Um dia ele convidou toda a turma para ir a um barzinho no centro de BH. Lorena não queria ir, mas entre estar com todos, e ficar sozinha dentro de casa, preferiu acompanhar o grupo, pois o safado poderia se aproveitar da ausência de todos, e voltar para aprontar alguma. Ela não confiava nele nem um milímetro, e percebia seus olhares mal intencionados.

Foram em dois carros, e ele fez questão de que Lorena entrasse no carro dele, inclusive colocando-a na parte de trás do assento do motorista, onde ele estaria. Na parte de trás estavam Lorena, Elena e o namorado, este mais comportado. Havia sido seminarista, e era mais tranquilo e respeitador.

Como Lorena era muito tímida, o italiano queria achar uma forma de conseguir seus intentos, e resolveu embebedá-la com vinho, e lá no barzinho a forçava a tomar uma taça atrás da outra. Ela foi tentando se segurar tomando a bebida mais devagar, comendo alguma coisa, mas como não tinha costume de beber, logo começou a ficar tonta. Com medo do que poderia acontecer, interiormente rezava o tempo todo para que Deus a protegesse e pudesse sair daquela situação ilesa, pois ele era do tipo violento, que batia se não fosse obedecido.

Na hora em que ela terminou a terceira taça, ele gritou para o garçom trazer mais uma, e foi ao banheiro. Todos estavam com medo e nervosos com o que ele poderia fazer. Ela, num raciocínio rápido lembrou-se de que se tomasse algo doce poderia resolver a situação. Mais rapidamente pediu ao garçom que substituísse o vinho por grapete. O garçom também estava assustado com a situação e a olhava com dó, e correu rápido para pegar a outra bebida solicitada por ela.

Quando ele colocou a taça na sua frente, ela se sentiu mais segura. Havia sido a Providência Divina que o afastara dali por uns minutos para que ela pudesse tomar aquela atitude. Ficou esperando que ele voltasse.

Quando ele viu a taça cheia na frente dela gritou para que tomasse toda de uma vez.

Lorena fingiu que não queria, mas bebeu, e ele, já tendo bebido muito também ficou com os olhos brilhando, talvez imaginando que iria conseguir deixá-la bêbada, e poderia agir como quisesse.

Ele nem imaginou que ela, ao invés de tontear estava se curando da bebedeira, pois estava repondo sua glicose.

Ao sairem dali ele estava admirado de que ela não estivesse trocando as pernas, e dizia em alta voz rindo:- Você é forte, eim garota! E dava gargalhadas.

Entraram todos no carro, e ele pegou a avenida Amazonas, que é uma das principais da cidade, em alta velocidade. As moças moravam nesta avenida, mas ele passou direto pela casa delas, e corria muito. A certa altura, Júlia, a namorada dele disse que precisava ir ao banheiro, e ele só parou o carro em um posto de gasolina, depois de andar ainda alguns kilometros. Estavam bem longe de casa.

Quando Júlia desceu, ele virou o corpo para trás e levou os braços tentando agarrar Lorena. Ela se abaixou o máximo que pode, e ele não conseguiu segurá-la ou beijá-la, como parecia ser sua intenção.

Os outros dois que estavam do seu lado arregalaram os olhos, e ela olhou para o namorado da sua amiga, como que a perguntar o que deveria fazer. Ele lhe deu sinal com os olhos, de que estava preocupado, mas que tivesse calma, e ela sabia que a presença dele é que estava impedindo o italiano de conseguir seu intento, pois sua namorada não o impediria de nada. Não conseguiria.

Lorena rezava o tempo todo pedindo ajuda a Deus, e se mantinha quieta no seu cantinho.

Rapidamente Júlia voltou, pois também estava preocupada com a situação, e tinha medo dele. Tentou ser o mais firme possível, e pediu-lhe que voltasse, pois era muito tarde, e todos estavam com sono, além do que precisariam trabalhar no dia seguinte.

Ele deu uma gargalhada sonora, e como se algo o movesse deu meia volta na estrada e voltou para a cidade pela mesma avenida. Todos respiraram fundo, pois a tensão era muito grande.

Felizmente Deus ajudou que ele parasse em frente à casa em que elas moravam, e todos desceram sãos e salvos.

Naquele momento Lorena prometeu a si mesma que jamais sairia novamente com ele, ou aceitaria qualquer convite vindo daquele homem.

Durante toda a noite sua cabeça rodou, e ela não conseguiu dormir. A cama parecia girar, e o efeito retardado do vinho chegou durante o sono. Foi uma noite muito agitada, tanto com as lembranças do dia, quanto com o quarto rodando.

No dia seguinte chovia muito, e ela estava cansada, insone, com dor de cabeça, mas precisava trabalhar. Arrumou-se, tomou um bom banho para se reanimar, pegou o ônibus e foi cumprir sua obrigação.

Ao subir a rampa molhada do prédio em que trabalhava, não se sabe se escorregou, ou se teve uma vertigem, de repente caiu batendo com a testa no chão. Parecia que dentro do cérebro havia uma lata, que vibrou com força, e numa reação automática Lorena sentou-se completamente tonta.

As pessoas que também trabalhavam no mesmo prédio, e estavam chegando, a socorreram. Colocaram-na sentada na recepção do prédio, e chamaram o médico, em cujo escritório ela era recepcionista. Ele conseguiu um pouco de gelo, colocou no local, e a levou para o escritório, passando um remédio no local, para que não inchasse muito.

Cresceu um hematoma enorme na sua testa, deixando o olho direito inchado, e Lorena trabalhou assim mesmo durante todo o dia.

À noite não foi para a faculdade. Resolveu descansar e tentar recuperar o sono que havia perdido na noite anterior, mesmo porque estava se sentindo com a pressão um pouco abaixo do normal. Havia se alimentado mal durante o dia, e teve medo de não se sentir bem na escola.

Daquele dia em diante sua meta seria mudar-se daquele lugar.