A façanha de Ércolis

Bem lá no meio do sertão nasce uma criança miudinha, de olhos esbugalhados, de berro estrindente, de cabeça gigantesca e sem nenhum cabelo. Para mãe a dona Dorinda esse bebê representa uma dádiva, e o para o pai é um sorriso estatelado que demonstra a todos que seu legado veio ao mundo. Deram a esse menino o nome de Ércolis.

Alimentado com bastante mandioca o pequeno Ércolis virou uma criança peralta, e dizia que conhecia todo o sertão como a palma de sua mão e que poderia andar de olhos (que fique entre nós, o sertão para ele consisti em 3 pequenas vilas sendo uma grudada na outra e os arredores de terra semi-árida, portanto, não era tanta coisa, mas para ele era o mundo inteiro).

O “causo” aconteceu 7 dias depois da grande missa da pequenina Igreja dos Milagres. Ela encheu-se de fiéis e eles depositaram no altar de Nossa Senhora um mar de velas e pedidos. Na vila restaram poucas velas e quase nenhum fósforo. No domingo fatídico um denso nevoeiro escondeu as estrelas e a lua, e um zum zum ecoou pelas vilas. Ninguém enxergava a ponta do próprio nariz e com isso o medo dominou o pequeno sertão.

Ércolis que preferia ficar sem sua preciosa rapadura a ser chamado de covarde, foi até a gaveta do criado mudo da mãe, pegou um toquinho de vela e uma caixa com somente seis fósforos. Então o menino peregrinou de casa em casa no grande breu da noite para acender outros toquinhos de vela, porém, para atravessar por entre os vilarejos ventava muito portanto, corajosamente ele apagava a minúscula chama e confiava cegamente em seus instintos sem o menor temor. Sua procissão prosseguiu até o raiar do novo dia.

Ércolis cansado passou a roncar debaixo de uma jaqueira magricela, e em sua direção uma multidão de sertanejos liderados pelos seus pais acordaram o pequenino e todos o olharam com uma imensa gratidão e um orgulho que não cabia nos corações pelo seu feito heróico.

E a partir desse dia, ecoou por todo esse gigante sertão a maior estória de todas: “a façanha de Ércolis”.